Três Antídotos Contra o Remorso Paterno

(II Samuel 18:5-9, 15, 31-33)

A história do relacionamento de Davi com seu filho Absalão é uma das mais intensas e tocantes dentre as histórias do Velho Testamento. Poucos temas na literatura evocam mais emoção do que a desintegração gradual e por fim a morte do relacionamento na família. A cada estágio, no desenrolar da história, o leitor espera que algo seja feito para corrigir os erros e curar as feridas. No caso de Davi e Absalão, essa reconciliação nunca ocorreu.

A história finda com um pai cheio de remorsos, pranteando por seu filho que fora morto na batalha irrompida em decorrência do relacionamento fracassado entre eles. Porém, a história inicia muito antes. As raízes da dissensão na família de Davi podem ser traçadas a partir de uma tarde primaveril em Jerusalém. Davi estava no palácio real naquela tarde, e esse é um dado importante. Ele havia conquistado o coração do povo e foi aceito como rei devido às suas grandes proezas no campo de batalha. Fora um soldado destemido e um proeminente comandante. Um líder. Seguidas vezes levara o exército de Israel à vitória.

Mas naquela tarde primaveril, Davi enviou suas tropas para o campo de batalha, delegando o comando a Joabe, e ficou em seu palácio. Agora era o rei. Possivelmente pensou que havia conquistado o direito de ficar no palácio enquanto os outros travavam as batalhas por ele.

Ao caminhar pelo terraço da casa real, nesse dia, viu uma mulher formosa banhando-se. Os mensageiros do rei trouxeram-na à sua presença e naquela noite ele adulterou com essa mulher chamada Bate-Seba. Então Davi tramou para que o marido dela fosse morto. Absalão, provavelmente, era apenas um menino na noite em que seu pai cometeu o adultério. Talvez nem mesmo tenha tomado conhecimento desse adultério e assassinato. No entanto, Davi sabia e também Deus, e isso o afetou de formas sutis e dramáticas para o resto de sua vida.

Absalão já era um rapaz quando outro filho de Davi – Amnom – violentou Tamar, a irmã de Absalão, a despeito dos rogos da moça para que não praticasse esse ato vergonhoso. Quando Absalão tomou conhecimento do estupro de sua irmã, sentiu-se ultrajado. Por dois anos tramou vingança e então fez com que Amnom fosse morto.

Davi também tomara conhecimento do estupro. Amnom havia violado sua filha, mas Davi nada fez, não o disciplinou de forma alguma. Então ficou sabendo que Absalão mandara matar Amnom e novamente não tomou qualquer providência. O que poderia fazer sem ouvir a acusação: “Pai, fiz apenas o que o senhor já fez. O senhor também cometeu adultério e assassinato”. Assim teve início o que passou a ser um padrão no relacionamento de Davi com sua família: excessiva dedicação aos assuntos de seu reino, impureza no estilo de vida e passividade com os filhos.

O Rei Davi não foi o primeiro e não será o último pai a ter sucesso no trabalho e a fracassar com sua família. Perguntaram à filha de Pete Rose que tipo de pai o grande jogador de beisebol havia sido e em resposta ela disse que ele sempre estivera mais interessado no beisebol do que nos filhos. Ela negou que ele os tivesse amado afirmando que quase nunca estava presente. Quando pediram ao Pete para responder aos comentários de sua filha, ele disse: “Não sei qual é o problema com ela. Acabo de lhe comprar e enviar uma Mercedes nova”. Aparentemente, “Charlie Hustle” limitou seu grande afã à quadra de beisebol.

Excessiva dedicação ao trabalho, estilo de vida impuro e passividade com os filhos – essas características não são exclusivas no Rei Davi. Elas podem ser até mesmo encontradas na igreja, no domingo pela manhã. Quando se permite que infectem o lar, são venenos mortais que levarão ao amargo remorso por parte de pais e filhos. Mas, graças a Deus, há antídotos para o veneno da passividade, impureza e excessiva dedicação ao trabalho.

I. O antídoto contra a passividade é a disciplina ministrada com amor.

Quando Amnom violou Tamar, Davi não tomou qualquer atitude. A Bíblia diz que ele ficou irado, mas isso foi tudo (II Samuel 13:21). Quando Absalão mandou matar Amnom, Davi não respondeu. Em situações de crise, que envolviam sérias questões morais, Davi era passivo.

Deus concedeu aos pais a função de liderança moral e espiritual no lar. Um dos dez mandamentos é: “Honra a teu pai e a tua mãe”. Por meio de Moisés, Deus também disse aos israelitas: “Amarás, pois, o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, e de toda a tua força. Estas palavras que hoje te ordeno, estarão no teu cora-ção; tu as inculcarás a teus filhos, …” (Deuteronômio 6:5-7). O treinamento moral e espiritual dos filhos é responsabilidade dos pais. Esse princípio é repetido no Novo Testamento, em Efésios. “Filhos, obedecei a vossos pais no Senhor, pois isto é justo. Honra a teu pai e a tua mãe … E vós, pais, não provoqueis vossos filhos à ira, mas criai-os na disciplina e na admoestação do Senhor” (Efésios 6:1-4).

Esses e outros versos lançam a pedra fundamental para um lar feliz e bem-sucedido e também para uma sociedade próspera. Os pais devem conduzir os filhos no bom caminho, ou seja, amar a Deus e obedecer à Sua Palavra. Os pais devem ensinar aos filhos o que significa dizer “sim” a Deus e “não” ao mundo. Quer seja algo mostrado na televisão ou que ocorra na vizinhança, quando surgem questões de certo e errado, os pais utilizam essas situações como oportunidades para ensinar a seus filhos.

Davi amava a Absalão? Ao que parece o amava suficientemente para morrer por ele. Davi disse: “Quem me dera eu morrera por ti” (II Samuel 18:33). No entanto, Davi não expressou adequadamente esse amor na forma de disciplina. O Senhor podia dizer o mesmo sobre Davi do que disse sobre Eli: “… porque seus filhos se fizeram execráveis, e ele os não repreendeu” (I Samuel 3:13). A disciplina ministrada com amor é o antídoto para a passividade.

II. O antídoto para a impureza é o bom exemplo

Muitas vezes ocorrem casos de indivíduos que ficaram muito acima do exemplo espiritual de seus pais. Uma pessoa do meu relacionamento no ministério foi criada por pais alcoólatras, que pouco contribuíram para a sua formação do caráter e nada com respeito ao relacionamento com Deus; estavam embriagados a maior parte do tempo. Porém, essa pessoa encontrou a Cristo em um culto de reavivamento, na pequena Igreja Batista em minha cidade natal. Deus o chamou para um serviço cristão vocacional e o conduziu a uma mulher cristã excepcional para ser sua esposa. Fielmente ele serviu a Deus e pregou Sua Palavra por muitos anos – isso a despeito de seus pais, não por causa deles. Graças a Deus por Sua graça e poder; com Cristo não precisamos repetir os defeitos de caráter modelados por nossos pais.

Por outro lado, a realidade em nosso mundo é que muitos não acessam o poder de Deus para ficarem acima do exemplo paterno. Antes, conformam-se ao que foram ex-postos no lar. Esse foi o caso de Absalão. De muitas formas, ele se assemelhava ao pai. Anos antes, Davi fora descrito como tendo belos olhos e boa aparência (I Samuel 16:12). Ao Absalão atingir a juventude foi escrito sobre ele: “Não havia, porém, em todo o Israel homem tão celebrado por sua beleza como Absalão” (II Samuel 14:25). Davi e Absalão eram favorecidos fisicamente. Davi havia se tornado popular e conquistara o coração do povo de modo a desejarem torná-lo rei no lugar de Saul. Absalão também sabia como fazer amigos e influenciar as pessoas. A Bíblia diz que ele “furtava o coração dos homens de Israel” levando-os a desejarem torná-lo rei no lugar de Davi. Quando Absalão era jo-vem, Davi mandou matar um homem, quando Absalão tornou-se mais velho, mandou matar um homem. Absalão era o que costumamos dizer “tal pai, tal filho”.

Davi foi um homem que conhecia e amava a Deus mas que, de forma crescente, vivia um estilo de vida impuro. Sem dúvida isso afetou sua família. Na maior parte das vezes, Absalão escolheu seguir as pegadas do pai. Com a morte de Absalão, Davi colheu o amargo fruto das sementes que semeara anos antes no lar.

Os valores são melhor captados do que ensinados. Nossos filhos vêem nossos verdadeiros valores pela nossa vida diária, não por aquilo que dizemos na escola domini-cal. A melhor forma que conheço para educar filhos que fiquem ao lado de Deus diante da pressão do grupo é ter pais que exemplifiquem um estilo de vida com base na Palavra de Deus e não nos padrões da sociedade. A melhor forma que conheço para educar filhos que partilhem o evangelho e dêem testemunho é ver os seus pais fazerem isso. A melhor forma que conheço para criar uma geração de crentes que administram o dinheiro de acordo com a sabedoria de Deus é ter pais que modelem santidade na área das finanças.

Havia graves impurezas na vida de Davi, e seu filho escolheu seguir-lhe o exemplo. A impureza do pai se assemelha a um veneno no lar e o antídoto para ela é o bom exemplo.

III. O antídoto contra o excesso de dedicação ao trabalho é o envolvimento consistente

A história de Davi e Absalão é um trágico caso de amor que nunca foi expressado pelo envolvimento consistente. Quando sua irmã foi violada, Absalão ficou irado e incon-solável – porém nunca conversou com o pai sobre sua ira e inconformação.

Suspeito que o motivo para Absalão não expressar seus sentimentos a seu pai foi que ele nunca tomou tempo para desenvolver um relacionamento íntimo com seu filho. Absalão nunca soube que seus sentimentos eram apreciados por seu pai. Muitas vezes o motivo porque os jovens não buscam os pais quando estão magoados é porque o papai não ouviu a mágoa do filho quando o procurou com um brinquedo quebrado. Pais, se de-sejam estar envolvidos nas grandes decisões da vida de seus filhos, é melhor começar por envolver-se nas cotidianas diárias e aparentemente insignificantes.

Mesmo depois de Absalão haver mandado matar Amnom, Davi não tomou qual-quer atitude, da mesma forma como agira quando do estupro. Porém, Absalão temendo que Davi fosse puni-lo fugiu e refugiou-se em um país estrangeiro por três anos. O escri-tor de II Samuel escreve: “Então tinha o rei Davi saudades de Absalão” (v. 13:39), mas Davi nada fez para se encontrar com Absalão ou deixá-lo saber que estava com sauda-des. Joabe finalmente convenceu Absalão a voltar. No entanto, por dois anos pai e filho viveram na mesma cidade sem se verem. Até quanto sabemos, Davi nunca fez qualquer esforço para curar as velhas feridas. Talvez não fosse tarde demais para restabelecer os relacionamentos rompidos, mas Davi nunca tentou – a falta de envolvimento paterno per-petuou-se.

Assim, após dois anos em Jerusalém sem ver a Davi, Absalão pediu ao conselheiro do rei por uma oportunidade de ver seu pai. Ele disse: “Agora, pois, quero ver a face do rei; se há em mim alguma culpa, que me mate” (II Samuel 14:32). Em outras palavras, Absalão preferia ver o rosto de se pai e morrer a continuar vivendo separado dele. No entanto, Absalão viu a face de seu pai, o distanciamento entre eles continuou e ele foi morto pelos soldados de seu pai.

Davi amava seu filho, mas nunca se envolveu suficientemente com ele para ajudá-lo ou para tomar conhecimento de suas necessidades. Pelo que sabemos, Absalão foi tratado com frieza durante toda a sua vida. Apenas a morte dele fez Davi chorar e proferir as palavras que talvez Absalão ansiasse ouvir por anos: “Meu filho Absalão, meu filho Absalão! Quem me dera que eu morrera por ti, Absalão, meu filho, meu filho!” (II Samuel 18:33).

Vários anos atrás, Ann Landers publicou uma carta titulada “Papai Esperou Demasiadamente para Expressar Amor por Seu Filho”, com o seguinte teor:

“Querida Ann Landers: Fui tocado às lágrimas por uma carta em sua coluna de uma mãe que perguntava com que idade um pai e seu filho deviam deixar de se beijar e dizer ‘eu o amo’? Sua resposta resumiu-se a uma palavra ‘nunca’. Como você estava cer-ta. Há poucas semanas beijei meu filho pela primeira vez e disse-lhe também pela primei-ra vez que o amava. Infelizmente ele não ficou sabendo porque estava morto. Havia se suicidado. O maior remorso de minha vida é que tratei meu filho com frieza. Eu cria que era sinal de fraqueza os homens mostrarem afeição um pelo outro. Tratei meu filho como fui tratado por meu pai, e agora percebo que foi um terrível erro. Por favor, diga a seus leitores do sexo masculino que foram criados por pais machistas que é cruel não manifestar afeição por seus filhos. Nunca conseguirei me recobrar de minha ignorância e estupidez. (Sem nome, cidade ou estado)”.

A resposta: “Prezado Amigo, sua carta causou um maior impacto nos pais do que tudo o que eu pudesse ter dito. A vida é peculiar. Aguarda até que sejamos reprovados no curso para então nos ensinar a lição”.

A última afirmação não é absolutamente verdadeira. Não é necessário esperar até ser reprovado como pai, ou mãe, ou o que quer que Deus deseje para que você, antes que possa dizer: “Com a ajuda de Deus, tudo será diferente! A disciplina com amor, o bom exemplo e o envolvimento consistente caracterizarão minha liderança paterna!” Se seu filho ou filha ainda estiverem vivos, não é tarde demais para endireitar os relaciona-mentos, e se o seu pai ou mãe ainda estiverem vivos, você pode tomar a iniciativa da re-conciliação. Não espere até que seja tarde demais.

Uma palavra final – ao analisar as faltas de Davi como pai e a cena onde chora a morte de seu filho, temos um retrato do amor de Deus como Pai. Davi preferiria ter morri-do no lugar de seu filho; o que ele desejou fazer, Deus fez. A despeito de nossas faltas, Deus nos ama tanto que veio morrer na cruz por nossos pecados. Se você se voltar para Ele agora, Ele irá perdoar-lhe os pecados e o fará Seu filho. Não procrastine.

[Extraído de: Preaching, julho-agosto de 1994, págs. 49-51.]

Sobre Weleson Fernandes

Escritor & Evangelista da União Central Brasileira

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