A guerreira Damares contra o carnaval dos baixinhos

Nota: Estou republicando esse post. Algumas pessoas me chamaram atenção de que não era recomendável exibir a fotografia que ilustrava a versão original. Concordo. A figura era abjeta. O objetivo era, justamente, chamar a atenção para o nível de patifaria que a coisa chegou. E não é de agora. Sai a foto. Fica o texto. Quem tiver interesse em olhar a foto, tranque o nojo e procure na internet pelo disco da Xuxa sobre o Carnaval dos Baixinhos.

A campanha da Damares sobre a gravidez na adolescência está no ar (https://www.youtube.com/watch?v=a1nzfkS2VIE). Essa campanha sóbria, induzindo os jovens à reflexão, contrasta fortemente com campanhas de governos anteriores, que praticamente induziam as pessoas, jovens ou adultos, à atividade sexual irresponsável. Os clips de TV apresentavam o Carnaval e o sexo casual de forma glamourizada (https://www.youtube.com/watch?v=KBjsCJg4Jro). A mensagem parecia ser: “O sexo casual no Carnaval faz parte da ordem natural das coisas. No Carnaval, transem à vontade, sem preconceitos e sem restrições. O Grande Pai Governo fornece as camisinhas e as pílulas do dia seguinte”.

Foi só a Damares anunciar a campanha                                                                  (https://www.youtube.com/watch?v=Q7dT7WFtARY) para que se iniciasse uma forte rejeição da mesma, baseada em falsas interpretações e, muitas vezes, em má-fé mesmo. A jornalista Isabelle Barone desmistificou na Gazeta do Povo essas incompreensões sobre a política da Damares (https://www.gazetadopovo.com.br/…/abstinencia-sexual-a-acao…).

Uma das principais incompreensões diz respeito à suposição de que Damares estaria querendo proibir os jovens de transarem. Isso é, simplesmente, uma vigarice. A Damares não quer e não pode coagir os jovens a não transarem. A campanha consiste apenas em um convite à reflexão. Os jovens são convidados a ponderarem sobre as vantagens e desvantagens do início precoce da atividade sexual.

O papel dos adultos responsável é justamente esse, de aconselhar os jovens. O adulto que aconselha está assumindo sua responsabilidade. Só assume essa responsabilidade quem acredita ter um legado a transmitir para as gerações futuras. Só quem reconhece e aprecia um legado cultural.

Se os jovens vão seguir os conselhos ou não, é uma história completamente diferente. O adulto diz assim: “Falo pela minha experiência, se você fizer assim, vai dar certo. Se você fizer assado, é grande a probabilidade de que dê errado”. Como não existe transplante de juízo, no final das contas, o jovem vai fazer o que lhe der na telha.

Não se trata de coação, mas de aconselhar, de apontar um caminho. Para isso é preciso criar uma cultura familiar de diálogo, ponderação e cultivo de valores. Na verdade, as crianças já estão sendo coagidas a iniciar a atividade sexual na idade mais precoce possível. Vejam a capa do disco da Xuxa de 1988, intitulado “Carnaval dos Baixinhos”, que ilustra esse post. Vejam os bailes funk promovidos nas escolas (https://www.youtube.com/watch?v=N06U44cFEKI).

Essa história do funk nas escolas, por exemplo, reflete uma perversão completa da pedagogia contemporânea. A sabedoria pedagógica convencional prescreve atividades motivadoras e significativas para os alunos. Ou seja, as atividades pedagógicas devem ser acessíveis ao seu contexto cultural. O funk faz parte do contexto cultural das favelas. Daí a idéia genial de ensinar funk na escola. Mas, espera aí! As crianças já aprendem o funk na favela e na mídia. A escola não precisa “ensinar-lhes”. O que a escola precisa ensinar é… o currículo escolar. O acesso ao currículo que a escola deveria transmitir é a chance que as crianças menos favorecidas podem ter. Se a escola não cumprir o seu papel e ficar lhes “ensinando” apenas o que as crianças já aprenderiam de qualquer forma, estará lhes prestando um desserviço.

O ethos atual, promovido pela mídia inescrupulosa, por pedagogias doutrinadoras e por famílias desagregadas, está coagindo as crianças a iniciarem a atividade sexual cada vez mais cedo. A campanha da Damares só pretende mostrar aos jovens que existe uma alternativa e que esse caminho alternativo é mais promissor. Trata-se apenas de uma tentativa de substituição de ethos.

A Damares tem motivações religiosas? Claro que tem. A Damares é convicta da sua crença e dos seus valores. Mas, qual é o pó? Outras políticas, previamente implementadas, também eram imbuídas de outros valores e crenças. Um diferencial dessa política da Damares, entretanto, é convergir com evidências científicas, teóricas e empíricas, muito importantes.

Um modelo teórico muito interessante, que nos ajuda a contextualizar a política da Damares, é a Teoria da Previsão do Tempo (TPT), proposta por Jay Belsky (vide revisão em Haase, 2009). Resumidamente, a proposta de Belsky se baseia na pressuposição de que o desenvolvimento humano é plástico, epigenético, dependendo de uma complexa interação entre influências genéticas e ambientais. A teoria também se baseia no conceito de primazia dos eventos iniciais. Os eventos iniciais de vida, tais como a nutrição no ambiente fetal ou as primeiras experiências de apego com os pais, podem ter conseqüências em fases subseqüentes da vida, por vezes remotas no tempo. P. ex., desnutrição fetal é fator de risco para obesidade, diabete e hipertensão arterial na maturidade.

A principal evidência empírica que sustenta a TPT é o fato de que as crianças oriundas de famílias disfuncionais, caracterizadas por conflito conjugal, ausência do pai, multiparcerias, negligência ou maus-tratos etc., tendem a acelerar o início da puberdade. E a aceleracão da puberdade propicia o início precoce da atividade sexual. Por sua vez, o início precoce da vida sexual se associa com impulsividade, imediatismo, risco de gravidez, sexo inseguro, promiscuidade, abuso de substâncias etc. Pode-se criar assim um ciclo intergeracional de transmissão de comportamentos sociais desadaptativos.

Assim que as ferramentas, estão prontas, o jovem quer usá-las. A antecipação da puberdade, e da atividades sexual constitui, portanto, um mecanismo biológico que media entre experiências desfavoráveis de apego no início da vida e comportamentos socialmente desadaptativos muitos anos mais tarde.

Os padrões de desenvolvimento descritos pela TPT podem ser interpretados do ponto de vista evolucionário. A “previsão do tempo” funciona assim. Se as experiências iniciais de apego sinalizam um ambiente hostil, caracterizado por carência de recursos e relações interpessoais predatórias, é adaptativo DO PONTO DE VISTA EVOLUCIONÁRIO acelerar a puberdade e o início da reprodução, adotando uma estratégia reprodutiva mais quantitativa. Ou seja, mais filhos, mais cedo com pouco investimento parental, apostando que alguns filhos ao menos sobreviverão para transmitir os genes à geração seguinte.

Por outro lado, apenas se as experiências iniciais de apego sinalizam um ambiente mais favorável, com disponibilidade de recursos e relações interpessoais cooperativas, uma estratégia reprodutiva qualitativa – consistindo de postergar a reprodução, ter menos parceiros e filhos e investir mais nos filhos – pode conduzir à aptidão darwiniana.

É importante ressaltar a diferença entre aptidão darwiniana e aptidão psicossocial. A aptidão darwiniana é medida pelo sucesso na transmissão de genes de uma geração para outra. Iniciar a vida sexual e a reprodução precocemente. ter muitos filhos e dispensar menos cuidado a esses filhos pode ser darwinianamente adaptativo em um ambiente hostil, no qual as possibilidades de sobrevivência, qualificação sócio-competitiva pela educação e ascensão social são escassas. Por outro lado, a estratégia qualitativa só funcionará se o ambiente tiver uma qualidade mínima que propicie tanto o desenvolvimento psicossocial quanto a reprodução do indivíduo.

Qual é o papel do estado nessas circunstâncias? O papel do estado, na minha opinião, é fazer justamente o que a Damares está tentando fazer. Ou seja, fortalecer a família. Há uma convergência entre a campanha “Tudo tem seu tempo” de prevenção à gravidez na adolescência e a campanha “Conta pra mim” (https://www.youtube.com/watch…), incentivando os pais a contarem histórias para seus filhos. Além de complementares, essas duas políticas são inéditas no Brasil. Se vão gerar frutos ou não, o futuro dirá. De qualquer forma, não temos muita alternativa. Ou vamos continuar incentivando a sexualização precoce?

REFERÊNCIAS

Haase, V. G. (2009). O desenvolvimento humano como busca da felicidade. In V. G. Haase, V. G., F.F. Ferreira& F. J. Penna,(Orgs.) Aspectos biopsicossociais da saúde na infância e adolescência (pp. 601-603). Belo Horizonte: Coopmed.

Conferências em video

Há alguns videos no YouTube que auxiliam a se aprofundar mais no Modelo da Previsão do Tempo desenvolvido por Jay Belksy, e na sua formulação mais recente, o Modelo da Susceptibilidade Diferencial. Jay Belsky é um psicólogo do desenvolvimento que foi professor no University College, Londo, por algumas décadas e agora é professor na University of California, Davis. Três videos legais do Belsky são: a) (https://www.youtube.com/watch?v=qrSZVWT-_1c); b) (https://www.youtube.com/watch?v=yLXPA3V4EHk); c) (https://www.youtube.com/watch?v=BJT-aXEjp1I).

Uma outra conferência muito interessante foi proferida por Bruce Ellis, professor de psicologia do desenvolvimento na University of Utah (
https://www.youtube.com/watch?v=RkjgQ91EV4w). Ellis se aprofunda na fundamentação evolucionária da Teoria da Previsão do Tempo, usando um modelo conceitual chamado de Life-History Theory.

Autor: Vitor Geraldi Haase – via Facebook

Descubra mais sobre Weleson Fernandes

Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.

Sobre Weleson Fernandes

Evangelista da Igreja Adventista do sétimo dia, analista financeiro, formado em gestão financeira, pós graduado em controladoria de finanças, graduado em Teologia para Evangelistas pela Universidade Adventista de São Paulo. Autor de livros e de artigos, colunista no Blog Sétimo dia, Jovens Adventista. Tem participado como palestrante em seminários e em Conferências de evangelismo. Casado com Shirlene, é pai de três filhos.

Verifique também

8- A única resposta a violência – Intervenção

A. DEUS ESTÁ DISPOSTO A INTERVIR, EM MEIO À VIOLÊNCIA 1. Quando a violência propagou-se …

7- Ninguém merece sofrer a violência sexual de hoje

A. Os atos de violência e abuso sexual de nossos tempos aumentaram de maneira alarmante, …

6- A História de Maria: Estudo deste caso

(Apresente esta ilustração de forma prática) A. OBJETIVO – O objetivo desta apresentação é ajudar …

Deixe uma resposta