Débora Rodrigues dos Santos, casada, mãe de dois filhos – um de 6 anos e outro de 9 –, não tem nenhum antecedente criminal, mas está presa “preventivamente” há dois anos, mesmo sem oferecer risco para a sociedade.
Seu crime? Pichar a estátua do Supremo Tribunal Federal nos atos de 8 de janeiro de 2023, uma ação individual de menor potencial ofensivo, que poderia ser penalizada com prestação de serviços à comunidade.
Débora é membro regular da Igreja Adventista do Sétimo Dia.
Sim, eu sei. Ela não deveria ter ido aos protestos. A Igreja recomenda que seus membros não participem de manifestações políticas.
E a razão é simples: nossa prioridade é proclamar a mensagem presente, preparando pessoas para o reino de Deus, tanto as de direita quanto as de esquerda. Se nos posicionarmos politicamente, fechamos uma ou outra porta.
Mas Débora foi às manifestações e não deve ser julgada por isso. Afinal, quem de nós é melhor do que ela?
Ontem, horas antes do pôr-do-sol, li as 91 páginas da ação penal do juiz relator do caso, que votou pela condenação de Débora a 14 anos de prisão. A sentença final ainda depende do posicionamento dos demais ministros do STF.
Os crimes pelos quais Débora está sendo condenada incluem tentativa de golpe de estado, abolição violenta do estado democrático de direito, dano qualificado, deterioração do patrimônio tombado e associação criminosa armada.
Ler a ação penal foi uma experiência altamente instrutiva. Forneceu-me um vislumbre do tipo de malabarismo jurídico que poderá ser aplicado contra os guardadores do sábado quando a crise dominical chegar.
Foi também uma experiência duplamente dolorosa. A quantidade de contradições e ilegalidades é tão grande quanto os erros de português presentes no documento.
Tenho certeza de que a maioria dos “irmãos” que têm apoiado a condenação desproporcional de Débora nas redes sociais, muitas vezes de maneira dura e ofensiva, não leu as 91 páginas da ação penal. E se o fizesse, provavelmente não saberia interpretá-la à luz do ordenamento jurídico vigente em nosso país.
Mas é quase certo que muitos destes mesmos adventistas, que afirmam servir a um Deus que ama a justiça e a misericórdia, foram com sua Bíblia para a Escola Sabatina e participaram da recapitulação do Manual de Estudos com a naturalidade habitual, lendo textos como 1 João 4:20…
Se alguém disser: ‘Amo a Deus’, mas odiar o seu irmão, esse é mentiroso. Pois quem não ama o seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê.
… e Salmo 146:7…
[Deus] faz justiça aos oprimidos e dá pão aos que têm fome. O Senhor liberta os encarcerados.
… ou o texto de Ellen G. White em O Desejados de Todas as Nações, que diz:
Toda religião falsa ensina seus adeptos a serem descuidados para com as necessidades, sofrimentos e direitos humanos.
E discutiram tudo isso com a piedade costumeira.
Como observei em meus apontamentos da Lição da Escola Sabatina nesta manhã, há uma estranha desconexão entre o que professamos num ambiente controlado e nossas atitudes no mundo real.
O drama de Débora é mais um teste para a igreja – um teste que diz respeito ao nosso dever de servir às pessoas que enfrentam dificuldades e aflições, de revelar o amor de Deus aos outros especialmente na forma de justiça.
Podemos condená-la com a mesma indiferença e arbitrariedade demonstradas pelos membros da mais alta corte do país, ou nos solidarizar com ela, com seus familiares e com os demais presos condenados injustamente, manifestando a compaixão e a empatia que Cristo manifestaria se estivesse entre nós.
Qual será nossa escolha?
Fonte: Três Mensagens
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