À moda antiga

Eles estão dispostos a te ouvir e a pôr no papel o que você tem a dizer. São os escritores de cartas, que, espalhados por São Paulo, ajudam quem quiser a se comunicar com o mundo.

De um lado da folha em branco, alguém com vontade de pôr no papel seus pensamentos. Do outro, um voluntário ágil com a caneta, que traduz as ideias em palavras. Juntos, escrevem cartas com explicações pela ausência, pedidos de Natal, mensagens de saudade. São pessoas como Suely Calazans, uma das voluntárias mais antigas do programa Escreve Cartas, do governo de São Paulo, que ajuda pessoas que não sabem redigir a se comunicar. Com sua voz calma e firme, Suely está sempre em um dos postos do Poupatempo da capital paulista, onde os escrevedores fazem plantões de segunda a sábado, aguardando para transformar os papéis vazios em mensagens para pessoas distantes. E é ela que nos conta as histórias que leu, ouviu e que a emocionaram nestes dez anos como escritora de cartas.

Por que escrever cartas?

Suely – Tentamos fortalecer os laços de amizade e familiares e resgatar a cidadania – além das cartas, preenchemos documentos como currículos e pedidos de revisão de contas. Ainda há lugares em que só é possível se comunicar por escrito.

Onde, por exemplo?

Suely – As cartas que mais me tocam são as de mães com filhos na prisão. Elas sentem saudade e têm preocupação em mandar alguma coisa a eles. Uma vez, houve o caso de uma mãe que cuidava dos netos porque o filho estava preso em outra cidade. Ela sempre o visitava, mas perdeu o emprego. Aí veio aqui pedir uma carta para contar que não poderia mais vê-lo, pois ia usar o dinheiro da viagem para a alimentação dos netos.

Que outras pessoas procuram vocês?

Suely – São pessoas humildes, analfabetas ou que escrevem pouco. Elas têm dificuldade em pôr no papel o pensamento. As mulheres, de todas as idades, são a maioria, e grande parte das correspondências é para a família, amigos, namorado e até para programas de televisão. Lembro quando um compositor sertanejo nos pediu uma carta para ter a chance de se apresentar em um programa de TV. No fim, ele não se conformou com nosso serviço ser gratuito e, para agradecer, cantou para os voluntários.

Há datas em que tem mais gente querendo mandar cartas?

Suely – O fim do ano é sempre cheio, e o Natal é um período em que atendemos muitas pessoas. Teve um ano em que uma menina de 7 anos veio aqui para escrever uma carta para o Papai Noel. Mas ela não pediu nenhum brinquedo. Queria um cesta básica e disse para a voluntária escrever que ganhar presente deveria ser bom, mas ela preferia comer.

Pelo jeito, as histórias de quem passa por aqui ficam na memória… 

Suely – Ah, sim! Um caso marcante destes dez anos em que o programa existe foi o de um senhor que escreveu uma carta para um programa de televisão querendo voltar para a terra dele. Ele foi sorteado, o programa fez a mudança para a cidade natal e a gente sabe que ajudou. Há pessoas que voltam para ler as cartas que recebem ou para agradecer. Ficamos muito felizes com isso. Teve também um pai que escreveu uma cartinha para o Papai Noel aqui e a filha foi sorteada para ganhar o presente.

O que significa ser parte dessas vidas? 

Suely – Não é uma situação confortável saber que tantas pessoas não tiveram a felicidade de aprender a ler e a escrever e vivem como se estivessem cegas. E, infelizmente, a gente não tem como ajudar senão escrevendo por elas. Às vezes, a pessoa fala que nunca teve oportunidade de aprender, e a gente incentiva, dizendo que nunca é tarde para começar. Até indica locais onde ela possa começar a estudar. Mas o nosso objetivo aqui não é alfabetizar ninguém. Para mim, o fato de ajudar as pessoas a ficar mais próximas umas das outras é o mais importante de todo o trabalho.

Quer ser um escritor de cartas?

Quem inspirou o governo do estado de São Paulo a criar o Escreve Cartas foi a Dora, personagem do filme Central do Brasil, que escrevia na estação central do Rio de Janeiro. Agora é Suely, uma escritora de cartas de verdade, quem dá dicas para você montar a sua banquinha. Veja como!

 Para se dedicar ao ofício, você precisa dominar a língua e escrever bem. Além disso, é necessário ter tempo livre e paciência para ouvir o outro. A maior parte dos 224 voluntários do Escreve Cartas é aposentada, tem facilidade de comunicação e transmite confiança.

 É preciso guardar sigilo do que ouve. “Uma vez, um rapaz veio responder a um anúncio de namoro. Ele ditou a carta com suas boas intenções e pediu para colocar uma foto. Quando a voluntária pegou a imagem, viu que não se tratava da mesma pessoa, mas não falou nada. Não podemos interferir”, avisa Suely.

 Existem várias formas de escrever a carta. Há quem dite as palavras ou prefira listar o que quer para o escritor montar a mensagem. “A pessoa pode chegar dizendo que não tem nada na cabeça,  ou está emocionada, e o voluntário tem que arrancar os assuntos”, diz Suely.

 Saiba que esses encontros são imprevisíveis. “Uma vez, uma senhora chegou aos prantos. Ela queria escrever para um programa de televisão para que a ajudasse a pagar o aluguel, evitando o despejo”, diz Suely. “Como ela, muita gente vem desesperada, e o voluntário precisa ser sensível a isso.” Tenha em mente que você vai escrever uma carta – e não resolver os problemas do outro.

 Não cobre pelo que você pode oferecer de graça. Todas as cerca de 30 cartas diárias do Escreve Cartas são gratuitas!

 


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Sobre Weleson Fernandes

Evangelista da Igreja Adventista do sétimo dia, analista financeiro, formado em gestão financeira, pós graduado em controladoria de finanças, graduado em Teologia para Evangelistas pela Universidade Adventista de São Paulo. Autor de livros e de artigos, colunista no Blog Sétimo dia, Jovens Adventista. Tem participado como palestrante em seminários e em Conferências de evangelismo. Casado com Shirlene, é pai de três filhos.

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