Adoração Neopentecostal e Adventismo: Cantos e Desencantos 

Uma das faces mais reconhecíveis do movimento neopentecostal é sua ênfase no louvor coletivo. A especialista Magali Cunha, no livro Explosão Gospel (Ed. Mauad), afirma que a prática do louvor, por sua larga duração e ênfase litúrgica, está substituindo a pregação e estudo da Palavra como ponto central na teologia pentecostal. Desse modo, o sucesso dos ministérios de Adoração & Louvor, estrangeiros ou nacionais, tem contribuído para a exigência de modificação da tradicional liturgia protestante.

Na pesquisa sobre a música produzida pelos adventistas do sétimo dia no Brasil, tenho observado o interesse de líderes de louvor em desenvolver um modelo baseado na adoração neopentecostal. Claro, sem as manifestações extravagantes (como andar em quatro patas ou rodopiar) e sem o êxtase glossolálico (o falar em “línguas estranhas”). Assim, extraídos os elementos mais controversos, seria possível obter uma música capaz de entusiasmar as congregações adventistas.

O que, talvez, não esteja sendo discutido nos círculos musicais do adventismo é a real dificuldade de esvaziar uma música do seu valor simbólico de origem. Em uma pergunta de aplicação prática: uma música originalmente forjada segundo a ênfase neopentecostal no milagre, na unção e no êxtase místico poderia ser transplantada para outro contexto litúrgico sem carregar consigo essas particularidades a ela associadas?

O Denominador Mínimo Musical e o Denominador Máximo Doutrinário

Há quem diga que sim, é possível reduzir tal música a seu denominador mínimo musical e utilizá-la com sucesso em outro contexto evangélico. De que maneira? Por exemplo, restringindo as inúmeras repetições do refrão dessas músicas e descartando o excesso emocionalista e gestual. Assim, mesmo acompanhada da habitual contenção gestual dos adventistas, em geral, mais afeitos ao controle da euforia dentro dos templos, essa restrição das repetições ajudaria a criar um ambiente de adoração mais relevante ou, como gostam de dizer alguns, mais “intensos”.

Mas há aqueles que dizem que não é possível esconder o denominador máximo comum das músicas dos ministérios de louvor neopentecostais. Ou seja, essa música não criaria um ambiente mais favorável à adoração coletiva. Ao contrário, ela seria capaz de gerar novos atritos e divisões na igreja por dois motivos: seria musicalmente estranha à tradição doutrinária adventista (ela é rapidamente reconhecível devido à brevidade de sua letra e à repetição de certas expressões); e estaria associada a uma forma de culto cuja carga emocional é considerada excessiva para a tradição protestante (aqui, é mais acertado dizer que tal carga emocional é considerada excessiva para a tradição de culto adventista, e não para o protestantismo brasileiro em geral).

Adoração Neopentecostal e Adventismo

Aqui, estou falando de momentos de louvor em que algumas canções conhecidas e originárias do meio neopentecostal são utilizadas. Em geral, elas são apresentadas durante um programa jovem juntamente com o repertório adventista produzido para os jovens. Raramente, elas são cantadas nos cultos matutinos de sábado.

Alguns cantores protestantes adeptos da cultura neopentecostal de adoração, embora reduzam a longa duração original das canções e evitem os temas da cura e da prosperidade, reencenam algumas características dos shows ao vivo dos bem-sucedidos Ministérios de Louvor & Adoração. São elas:

  1. A preservação da voz chorosa nos momentos de “intercessão” e oração. Tese: demonstração de emoção espiritual e da manifestação do Espírito. Antítese: imitação de cantoras-líderes de grupos de louvor; exagero dramático; artificialidade. Síntese: a emoção espiritual faz parte da adoração, mas o estilo de adoração neopentecostal tem apresentado uma nítida teatralização da contrição.
  2. A sugestão de intensidade e/ou entrega espiritual por meio do levantar de mãos e do fechar dos olhos. Tese: o gesto também é expressão de espiritualidade. Antítese: demonstração de santidade exterior; exclusão social de quem não adota esse gestual (são chamados de “frios”).Síntese: a adoração contemporânea tem concedido aos gestos e expressões faciais o status de sinais visíveis de aparência de santidade.
  3. O emprego de canções com linguagem romântica. Tese: demonstração de intimidade relacional entre o ser humano e Deus. Antítese: expressões como “apaixonado por Jesus” têm forte conotação de relação passageira e trivial; confusão entre emoção libidinal e emoção espiritual. Síntese: embora não haja amor sem paixão (mas haja paixão sem amor), as expressões ligadas ao amor conjugal sugerem uma ênfase sentimental no relacionamento com Deus.

É inegável que os ministérios de louvor & adoração origem neopentecostal têm alcançado um feito admirável: o povo tomou gosto por cantar “no meio da congregação”, nos átrios, nos logradouros públicos. Mas também não se pode negar que o sucesso desse estilo musical nas rádios afora (muitas vezes consagrado na seção das “mais tocadas”) tem orientado a produção de canções que obedecem o mesmo estilo, como se seguissem uma fórmula.

Ao contemplar o sucesso midiático e, por que não, espiritual dos ministérios de louvor, alguns setores adventistas começam a rever certas práticas estagnadas. Quando essa necessária revisão está acompanhada da reflexão sobre a teologia das letras e do respeito à unidade congregacional, tanto melhor para a missão da igreja.


Fonte: Nota na Pauta

Autor: Joêzer Mendonça

Sobre Weleson Fernandes

Escritor & Evangelista da União Central Brasileira

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