A ideologia e a fé cristã

A ideologia, seja de direita ou de esquerda, tende a tornar as pessoas mais insensíveis, menos amorosas mesmo. E isso acontece até entre os cristãos. É fácil ver exemplos disso na internet.

No espectro esquerdo, dentre os que professam a fé cristã, mas defendem o socialismo, há os que relativizam o fato de que milhares de cristãos foram duramente perseguidos, torturados e mortos em regimes socialistas; e que ainda sofrem pesadas restrições em países como Coreia do Norte, China e Cuba.

No espectro direito, dentre os que professam a fé cristã, mas defendem algum regime militar do passado (como o de Pinochet, no Chile, ou o regime brasileiro de 64 a 85), há os que relativizam o fato de que o Estado se utilizou de tortura e execuções sumárias contra centenas de pessoas.

A relativização da vida alheia ocorre porque o amor à própria ideologia acaba eventualmente entrando em conflito direto com o amor ao próximo. Se o socialista, por um momento, se compadecer dos cristãos (e não cristãos) mortos nos regimes que ele defende, terá de reconhecer que sua ideologia não é boa.

De igual forma, se o adepto de um regime militar de direita, por um momento, tiver compaixão das pessoas torturadas e mortas sumariamente por um desses regimes, também terá de reconhecer que sua ideologia não é tão boa. E isso, numa mente ideologizada, significa dar vitória ao outro lado. Assim, vale mais amar a ideologia e defendê-la até a morte (a morte do outro, claro!) do que amar pessoas reais, criadas à imagem e semelhança de Deus, e pelas quais Cristo deu a própria vida.

A ideologia tende a criar o tipo de amor que Jesus afirmou não valer muita coisa. Em Mateus 5, após dizer aos seus ouvintes que eles deveriam amar os inimigos e orar pelos seus perseguidores, explicou: “Porque, se amardes os que vos amam, que recompensa tendes? Não fazem os publicanos também o mesmo? E, se saudardes somente os vossos irmãos, que fazeis de mais? Não fazem os gentios também o mesmo?” (Mt 5:46-47).

É fácil amar quem nos faz bem ou amar aqueles cujo nosso amor por eles traz lucro para nós. Mas a fé cristã nos insta a amar também quando este ato nos traz prejuízos. E é aqui que o cristão deve escolher se permanecerá com sua ideologia intacta, incólume, perfeita, ou se amará aqueles que sofreram debaixo de sua ideologia, reconhecendo que ela não presta.

Obs.: Ideologia aqui é qualquer sistema bastante estrito de ideias que busca avaliar, interpretar e modificar o mundo a partir de ações humanas (em especial, políticas), não abrindo muitas concessões para a possibilidade de a realidade ser mais complexa do que o sistema consegue captar. Como resultado, a ideologia é sempre dogmática e frequentemente incorre no erro de moldar a realidade aos seus pressupostos, em vez de moldar seus pressupostos à realidade.

A ideologia pode surgir da direita e da esquerda. Isso não significa que direita e esquerda sejam, em si mesmas, ideologias (ao menos, não no sentido aqui trabalhado). Direita e esquerda representam conjuntos de visões políticas econômicas e culturais que podem ou não ser ideologizadas. Em outras palavras, elas podem ou não ser transformadas em um sistema estrito de ideias que tenta moldar a realidade às suas pressuposições. Alguns exemplos de ideologia são: socialismo, marxismo, fascismo, nazismo e positivismo.

Eventualmente, o culto a determinadas personalidades políticas pode adquirir contornos ideológicos também, na medida em que se cria a partir da personalidade em questão um sistema de ideias estrito e com alto grau de discurso redentor (em termos terrenos e políticos). Ideologias também podem surgir a partir de religiões e até do ateísmo. A mescla entre religião e política, ou entre ateísmo e política, com vistas à criação de um estado confessional, também pode ser vista como ideológica, em especial se possuir um discurso redentor, onde o domínio estatal da religião ou do ateísmo é visto como a solução dos problemas do mundo. Evidentemente, tudo isso sempre desemboca em perseguição.

Por Davi Caldas

Fonte: Reação Adventista


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Sobre Weleson Fernandes

Evangelista da Igreja Adventista do sétimo dia, analista financeiro, formado em gestão financeira, pós graduado em controladoria de finanças, graduado em Teologia para Evangelistas pela Universidade Adventista de São Paulo. Autor de livros e de artigos, colunista no Blog Sétimo dia, Jovens Adventista. Tem participado como palestrante em seminários e em Conferências de evangelismo. Casado com Shirlene, é pai de três filhos.

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