Responda rápido: Por que Jesus Cristo necessitou morrer pela humanidade? À primeira vista, a pergunta é boba e a resposta é simples. Os evangelhos e mais todo o Novo Testamento nos expõem a razão de maneira clara e repetidas vezes. Em suma, todos nós somos pecadores. A consequência de ser pecador é a morte. Portanto, para oferecer ao ser humano o perdão dos pecados e a salvação, Cristo precisava se tornar humano como nós e assumir a consequência máxima dos nossos pecados: a morte. Sua morte era o único jeito de nos livrar de nossa condenação.
A explicação acima é a resposta padrão e todo o cristão minimamente comprometido com sua fé sabe expô-la mais ou menos nesses termos. No entanto (e é aqui que a coisa começa a complicar), quando nos aprofundamos na pergunta, esta resposta simples e rápida já não é suficiente para satisfazer a questão. Dizemos que Jesus necessitou morrer pela humanidade para nos perdoar e dar a vida eterna, certo? Mas por quê? Deus não poderia simplesmente oferecer o seu perdão, sem qualquer sacrifício? Por que um justo precisava morrer para que esse perdão fosse dado aos homens? Por que o simples ato de cada indivíduo pedir perdão a Deus não seria suficiente para ser perdoado? Qual é a necessidade da morte de Jesus nessa equação toda?
Quando paramos para pensar nessas perguntas, o sacrifício de Jesus pode parecer um tanto sem sentido. Não pedimos o sacrifício de alguém para perdoar uma pessoa, não é verdade? Simplesmente perdoamos. E é o que a própria Bíblia nos ensina. Então, por que seria necessário o sacrifício de Jesus? Por que Deus apenas não nos perdoou e esqueceu tudo, sem problemas?
Tais perguntas não são apenas pertinentes, mas imprescindíveis. Apenas uma resposta plausível a cada uma delas é capaz de dar sentido lógico ao cristianismo e demonstrar que Jesus foi bem mais que um simples homem bom. A necessidade da morte de Cristo, alegada pelos cristãos, é o âmago do Evangelho e de todas as doutrinas cristãs. Destrua essa necessidade e todo o cristianismo ruirá. Mas quantos cristãos estão preparados para dar essa resposta racional? Quantos estão cumprindo a exortação do apóstolo Pedro em sua primeira epístola? “Estando sempre preparados para responder a todo aquele que vos pedir a razão da esperança que há em vós” (I Pedro 3:15).
O objetivo desse texto, portanto, é oferecer esta resposta racional, demonstrando ainda a importância da questão e como ela é a base para as doutrinas mais importantes do cristianismo, como a divindade de Cristo e a triunidade de Deus. Vamos começar.
O Dilema de Deus
Para entender a necessidade da morte de Cristo, precisamos ter em mente que Deus apresenta duas funções em relação ao julgamento de nossos pecados: a de Pai, no sentido de ser nosso Criador e Mantenedor, e a de Juiz do Universo, no sentido de ter que zelar por um padrão de justiça imutável. Em suma, Deus é Pai, mas também é Juiz.
Nossos pecados, por sua vez, afetam as duas esferas: a esfera relacional (isto é, nossa relação com o Pai) e a esfera jurídica (isto é, nossa relação com a justiça moral). Isso é regra. Qualquer pecado que cometamos, sempre será um pecado contra Deus e contra a Justiça moral. Assim, quando uma pessoa comete um pecado ela precisa acertar contas com Deus e com a Justiça, os dois ofendidos.
Ora, para Deus é fácil nos conceder perdão relacional. Este perdão não requer qualquer pagamento ou punição pela ofensa. Requer apenas boa vontade do ofendido em perdoar o ofensor. É um perdão que tem a ver simplesmente com o restabelecimento de uma relação de amor entre ofensor e ofendido. Envolve a postura do ofendido de “esquecer” o pecado do ofensor, de não mais acusá-lo pela falta. Esse, portanto, é o perdão de Deus como Pai. É o perdão que restaura uma relação quebrada. Mas, como eu disse, Deus não é só Pai. Ele também é Juiz. É aqui que a coisa complica.
Como Juiz, Deus não pode simplesmente absolver o homem de seu pecado sem ressarcir a Justiça pela ofensa do pecador. Lembre-se: quando nós pecamos, pecamos contra Deus e contra a Justiça. E a Justiça sempre requer o pagamento pela ofensa cometida contra ela. E o Juiz do Universo precisa ser justo. Aqui temos um aparente dilema: ou Deus age como Pai amoroso e Juiz injusto, ou Deus age como Juiz justo e Pai cruel. E então? Amar o filho ou punir o criminoso? O que Deus deveria fazer? Esse é o dilema de Deus causado pelo pecado do homem.
A analogia do pai-delegado
Para entender melhor o dilema em que o pecado do ser humano colocou Deus, vamos imaginar uma situação hipotética. Um delegado recebe em sua delegacia seu próprio filho, que fora pego cometendo alguma infração civil. A infração é leve. O filho pode ser liberto mediante o pagamento de uma fiança. Mas o filho é um vagabundo e não possui meios para efetuar o pagamento. Ele assim é conduzido para cela, enquanto o pai-delegado resolve o que vai fazer com o rapaz.
Agora, reflita na situação do pai. Como pai, ele pode facilmente conceder o perdão relacional ao filho, absolvendo-o pela ofensa pessoal. Já vimos que este perdão não pede qualquer preço ou punição. Mas, como delegado, esse homem precisa acertar as contas do jovem com a Justiça (neste caso, a Justiça Civil/Penal). O delegado não pode simplesmente absolver seu filho, pois estaria sendo parcial e injusto. A Justiça requer um pagamento pela infração do rapaz. E ele, como delegado, não pode fugir a essa obrigação.
Como o pai-delegado pode livrar o filho da prisão, sem incorrer em injustiça? O que ele faz nessa situação? Só há uma resposta que não incorre em injustiça ou desamor: o pai paga a fiança do filho com seu próprio dinheiro, perdoando o rapaz de modo relacional e jurídico. O pagamento da fiança feito pelo pai-delegado absolve o filho-réu por completo, sem transgredir a Justiça.
O que Deus faz é exatamente a mesma coisa. Para agir corretamente como Pai e como Juiz, Ele resolve efetuar o pagamento que a Justiça requer pelo pecado do homem no lugar do próprio homem, a fim de que o mesmo tivesse a chance de ser perdoado não apenas na esfera relacional, mas na esfera da justiça moral.
Então, entendemos que para o homem acertar as contas com a Justiça, alguém deveria pagar o preço da ofensa que fora cometida contra ela. Esse alguém só poderia ser o próprio pecador ou o próprio ofendido – ou o homem, ou Deus. Uma vez que o preço do pecado é a morte do pecador, então o preço a ser pago por Deus em lugar do pecador só poderia ser a sua própria morte.
A Justiça como atributo de Deus
A questão que talvez seja levantada aqui é: como podemos provar que a Justiça aceita que outra pessoa morra em lugar do pecador? Não parece algo justo. Se eu cometo um pecado, eu é que preciso pagar por ele e não alguém inocente, não é mesmo? Como resolver este problema?
É aqui que devemos lembrar que a Justiça Moral da qual estamos falando não é algo independente de Deus. A Justiça é um atributo do próprio Deus. É uma característica intrínseca a Ele. A justiça faz parte da própria essência de Deus.
Quando nós entendemos isso, conseguimos visualizar que Deus é o único ser ofendido dessa história toda. Ele precisa agir em coerência com a Justiça não porque ela seja outro ser distinto dele e a quem deve explicações, mas porque ela é um atributo inerente a Ele. Deus não pode contradizer a sua própria essência. Se a Justiça é parte de Deus, Deus não pode, nem tem como agir de modo injusto. Sua posição de Justo Juiz é absolutamente imutável. A Justiça, de fato, é ofendida quando pecamos (e deve ser ressarcida), mas ela é ofendida como atributo de Deus e não como um ser distinto. Deus é o único ser ofendido aqui.
E daí? Aonde isso nos leva? Aqui faço uma citação de C. S. Lewis que irá nos ajudar. O famoso escritor britânico afirma em sua obra “Cristianismo Puro e Simples”, num dos seus trechos mais célebres, que apenas o ofendido pode perdoar o ofensor. Diz o trecho:
“Compreendemos que um homem perdoe as ofensas cometidas contra ele mesmo. Você pisa no meu pé, ou rouba meu dinheiro, e eu o perdoo. O que diríamos, no entanto, de um homem que, sem ter sido pisado ou roubado, anunciasse o perdão dos pisões e dos roubos cometidos contra os outros? Presunção asinina é a descrição mais gentil que podemos dar da sua conduta”.
Trazendo para o nosso caso, Deus, como sendo o Ser ofendido pelos pecados do homem, é o único que pode dar a eles o perdão. E, se o perdão completo depende do pagamento de um preço (a fim de que a Justiça seja ressarcida e Deus permaneça sendo perfeito Juiz), então Ele é o único que pode pagar este preço.
Talvez o leitor ache estranha essa equação: o ofendido paga o preço pela ofensa cometida contra si. Mas isso ocorre bastante entre humanos. Apresentei o exemplo do pai-delegado que paga a fiança do filho-réu, um exemplo que talvez não seja possível em nossa sociedade por uma questão de ética. Mas é bem rotineiro que pais comuns paguem a fiança de seus filhos infratores para que eles recebam liberdade. Também é comum que pais paguem um bom advogado para que seus filhos sejam absolvidos em julgamentos. Nestes casos, os pais estão pagando o preço por ofensas que foram cometidas contra eles mesmos. Quando cometemos uma infração civil, ofendemos a nossos pais, que sempre nos ensinaram a sermos justos. Os primeiros a serem atingidos por um crime são sempre os pais do criminoso (quando são pais de caráter, é claro).
O conceito de punição moral
Alguém poderia objetar que mesmo Deus sendo o ser ofendido, isso não daria a Ele o direito, dentro da justiça moral, de livrar o ser humano da punição/consequência pelo pecado. Uma pessoa com quem já debati afirmou que justiça se traduz em punição ao autor do ato criminoso. Desta forma, ninguém poderia tomar o lugar do homem na morte. Mas esta objeção se baseia em definições falsas de punição e justiça. Vamos entender melhor.
No nível moral, a punição não é um instrumento cujo objetivo é causar sofrimento, dor, angústia, tristeza e privação a um criminoso, buscando uma intensa sensação de prazer vingativo em ver o criminoso ser torturado. Não. A punição moral tem dois outros objetivos bem mais nobres e úteis que este: valorar negativamente o ato criminoso cometido (isto é, ressaltar que o ato cometido foi um erro) e gerar no criminoso uma postura de arrependimento genuíno que implique na abstenção do crime.
Em suma, para que a justiça seja feita no âmbito moral, a punição pelo ato precisa ressaltar negativamente o pecado e gerar arrependimento no pecador. E o sacrifício de Cristo se enquadra nisso? Perfeitamente. Quando Jesus assume a punição em lugar do ser humano por causa do pecado, ele ressalta sobremaneira a odiosidade do mesmo e o quanto ele precisa ser extirpado do ser humano; bem como oferece ao homem o perdão se o mesmo reconhecer essa odiosidade, arrepender-se e aceitar o seu sacrifício vicário como o único modo de ser salvo da morte.
Como o leitor pode perceber, aqueles que aceitam a Cristo, não podem ser condenados enquanto estiverem em Cristo. O sacrifício vicário de Jesus em suas vidas preenche os dois requisitos solicitados pela justiça, não restando nada que se possa falar contra a salvação dos mesmos.
Resumo da Ópera
Portanto, o sacrifício de Cristo era necessário porque, embora Deus pudesse nos perdoar facilmente como Pai, restabelecendo nosso relacionamento sem cobrar qualquer punição por isso, Ele não poderia fazer o mesmo como Juiz. Como Juiz, Deus precisava agir de acordo com o seu atributo intrínseco da Justiça. Ainda que se cogite que Deus possa agir em desacordo com um atributo que lhe é intrínseco, se Ele o fizesse seria acusado seriamente por Satanás como um Juiz parcial, injusto, condescendente com o pecado, quebrador de regras. Deus se encontrava na mesma situação de nosso pai-delegado, que não poderia simplesmente soltar o filho, sem que a pena devida fosse cumprida. Assim, para manter-se Justo e, ao mesmo tempo, Pai amoroso, Deus resolve assumir a punição em lugar dos homens, ressaltando o caráter odioso do pecado e instigando o ser humano a se arrepender. Um plano perfeito.
Implicações da necessidade do sacrifício de Cristo
Essa compreensão da necessidade da morte de Jesus não só confirma a coerência interna do cristianismo como nos ajuda a entender melhor algumas de suas mais importantes doutrinas: a divindade de Cristo, a triunidade de Deus e a exclusividade do cristianismo como religião verdadeira. Vou falar brevemente sobre como o sacrifício de Cristo leva a cada uma dessas doutrinas. Vamos começar pela doutrina da divindade de Jesus.
1) A divindade de Cristo:
Nós vimos acima que apenas o próprio ofendido pode perdoar o ofensor. Isso é algo bastante lógico. O amigo leitor não poderia perdoar, por exemplo, alguém que cometeu um pecado contra seu pai. É seu pai o único que pode e deve perdoar. O máximo que você pode fazer é perdoar o pecador por ele ter lhe ofendido quando pecou contra seu pai. Mas nesse caso, você não está perdoando propriamente a ofensa contra seu pai, mas apenas a lesão que a ofensa contra seu pai gerou em você mesmo. A ofensa contra seu pai em si só pode ser perdoada por seu próprio pai.
Nós também vimos que quando um homem resolve absolver um criminoso, deve ele mesmo sofrer as consequências do crime. Não faz sentido liberar o perdão, mas escolher a outra pessoa, que nada tem a ver com a situação, para sofrer a punição. Quando uma pessoa ofende a outra, a questão só envolve o ofendido e o ofensor. Não há espaço para um terceiro elemento. Portanto, se existe um preço a ser pago pelo pecado cometido, só há duas formas de resolver o problema aqui: ou o ofensor paga o preço pelo seu pecado, ou o ofendido toma o seu lugar, cumprindo a justiça e salvando o ofensor. Não existe uma terceira opção.
Se Jesus Cristo fosse apenas Filho de Deus, como interpretam alguns grupos religiosos, seu sacrifício não valeria absolutamente nada para a humanidade. Afinal, os pecados da humanidade são cometidos contra Deus. Então, se Deus quer perdoar-nos e tomar a nossa punição, apenas Ele mesmo pode fazê-lo. Jogar qualquer outro ser na equação, ainda que seja seu próprio Filho, invalida o perdão.
Jesus, na qualidade de apenas Filho, no máximo poderia perdoar as lesões que os pecados contra seu Pai o causaram, mas não os pecados em si cometidos contra o seu Pai. E Deus, por sua vez, não teria qualquer autoridade para perdoar legitimamente (isto é, sem contradizer a justiça) se Ele mesmo não se sacrificasse. Ao contrário disso, Ele apenas ratificaria a injustiça, pois estaria concordando com a morte brutal de um justo, que nada tinha ver com a situação, e eximindo-se da responsabilidade de assumir a pena, já que queria salvar o ser humano.
Então, se realmente o sacrifício de Cristo era necessário para nos perdoar moralmente e nos salvar da morte (e é isso o que a Bíblia afirma), Jesus Cristo só pode ser o próprio Deus. Ele é parte de Deus, um só em essência com o Pai. Seu sacrifício só faz sentido se assumirmos isso. Assim, toda a ofensa cometida contra o Pai era igualmente cometida contra o Filho, pois ambos eram um único Ser. E, por isso, Jesus tinha toda a autoridade para perdoar, pois Ele era o próprio Deus que estava morrendo por nós. Ninguém mais além de Deus poderia fazer isso de modo legítimo e eficaz.
2) A triunidade de Deus:
Aceitando que Cristo só poderia ser divino, já concluímos que Deus é, no mínimo, formado por duas pessoas divinas. Mas existem algumas informações bíblicas sobre as funções desempenhadas pelo Pai e pelo Filho que demonstram claramente que precisa haver mais uma pessoa na divindade. Acompanhe o raciocínio.
Embora Deus transcenda tudo o que criou (tempo, espaço, matéria e energia), não tendo sua natureza limitada por nenhuma de suas criaturas, Ele mesmo escolhe rebaixar-se ao nível delas (e já o fez no próprio ato criativo), a fim de relacionar-se. Não o faz por necessidade, mas por amor. Uma das formas pela qual fez isso foi se tornando visível e materializado como Pai e Filho. Antes que o amigo leitor me acuse de heresia, deixe-me lembrá-lo de algumas coisas. Sempre que Jesus Cristo se referia ao Pai, afirmava que Ele estava no céu. A mais famosa oração de Jesus, fornecida por ele como modelo para nós, começa como? “Pai Nosso que estás no céu”.
O céu, por sua vez, é sempre descrito pela Bíblia em termos espaciais, como sendo mesmo um lugar tangível e não uma realidade fora do tempo e do espaço. Tanto é que seus habitantes são narrados como tendo corpos. Enoque, que não viu a morte, mas foi tomado por Deus encontra-se no céu com corpo. Elias, que também subiu aos céus sem morrer e lá está, também lá entrou fisicamente. Jesus, o mais ilustre dos habitantes do céu, subiu de modo corpóreo também. Seu corpo glorificado após a ressurreição era tão físico que podia ser visto, ser tocado, andar pelo chão e comer alimentos. Detinha até as marcas de suas feridas nas mãos. Paulo, que também subiu aos céus (embora não tivesse certeza de que foi mentalmente ou fisicamente), afirmava que todos nós ganharíamos novos corpos na ressurreição, e subiríamos aos céus com eles.
O que quero dizer com tudo isso é que a Bíblia indica que não foi apenas Cristo que assumiu um corpo (no Antigo Testamento, um corpo de anjo – Ele é o tal “Anjo do Senhor”, por exemplo – e, no Novo Testamento, o corpo de homem), mas o próprio Pai escolheu incorporar-se. Outros textos ainda indicam isso. Por exemplo, a Bíblia diz que Moisés as costas de Deus no monte Sinai. Estevão viu Cristo sentado à destra do Pai antes de morrer. Diversos autores falam em que Deus tem um trono. Por mais que essas descrições possam estar repletas de simbolismos (não acreditamos na literalidade de um trono do qual nasce um rio, por exemplo) eles dão testemunho de que o Pai se encontra corporalmente em algum lugar. Em nenhum momento se fala do Pai estando na Terra ou mesmo em todos os lugares. Ele está no céu em tudo quanto é descrição.
O problema aqui é que se tanto o Pai, quanto o Filho escolhem estar em algum lugar fisicamente, deixam de lado o atributo divino da onipresença. Se o Pai está no céu e só no céu, não está na terra ou em outro local. O mesmo se dá com o Filho. Contudo, esse atributo é essencial para os planos de Deus. Como Ele poderia reger o universo e dar sua proteção a todos os homens não sem estar em todos os lugares?
É aqui que entra a função do Espírito Santo. O Espírito permaneceu sendo Espírito e por esse motivo está em todos os lugares. Jesus, quando promete aos seus discípulos que Eles seriam batizados pelo Espírito de Deus afirma que “o mundo não pode receber [o Espírito], porque não o vê, nem o conhece; vós [discípulos] os conheceis, porque ele habita convosco e estará em vós” (João 14:17). Tais palavras nos dizem muito. Jesus estava deixando claro que o Espírito Santo permanecia no meio deles e que, em breve, a presença desse Espírito se faria ainda mais forte, não mais no meio deles, mas (de algum modo desconhecido para nós) dentro deles.
Voltamos um pouco no Antigo Testamento para perceber o que Deus sempre esteve em meio ao seu povo através justamente do seu Espírito: Em Ageu 2:5 lemos: “[…] segundo a palavra da aliança que [Eu, o Senhor] fiz convosco, quando saístes do Egito, o meu Espírito habita no meio de vós; não temais”. A passagem ganha maior importância quando averiguamos que a promessa relembrada por Deus em Ageu está descrita em Êxodo 33:12-14: “Respondeu-lhe [o Senhor a Moisés]: ‘A minha presença irá contigo e eu te darei descanso’”. Tais palavras deixam claro que Deus se fazia presente entre o povo através do Espírito Santo.
Avançando novamente ao Novo Testamento, vemos que Jesus trata ao Espírito Santo não como uma força ou um poder enviado por Deus, mas como um agente pessoal, que o substituirá como consolador, que virá em seu nome, que ensinará e fará lembrar todas as coisas aos discípulos que convencerá as pessoas do pecado, da justiça e do juízo, que guiará à verdade e etc.
Todas essas informações não só deixam claro que existe uma pessoa na divindade como nos ajudam a pintar um quadro no qual a existência dessa terceira pessoa é essencial para que o cristianismo faça sentido. E é aqui que entra a relação entre o sacrifício de Cristo e a triunidade de Deus. Cada uma das pessoas da Trindade desempenha uma função específica no plano de redenção do homem. Enquanto Jesus Cristo se torna um ser humano e morre pela humanidade, o Pai é aquele que permanece mantendo a ordem e a direção do universo com todo o poder divino; e o Espírito Santo, aquele que está em todos os lugares, que tem acesso aos corações, que inspira, que influencia, que instiga, que ajuda, santifica, fortalece, ouve as orações e representa plenamente tanto o Pai quanto o Filho junto à humanidade.
A forma como a Bíblia Sagrada descreve tais funções, não permite a ideia de que Deus não seja uma Trindade. O Pai, em sua forma gloriosa, visível e corpórea, não adentra os corações, nem permanece em todos os lugares. Ele escolhe fazê-lo através do Espírito Santo. O Espírito Santo, por sua vez, não se faz visível, nem aparece em glória. Ele o faz através do Pai. O Pai, sendo o diretor do universo, não larga a direção para morrer pela humanidade. Ele o faz por meio de Cristo. Cristo, sendo o aquele que morre por nossos pecados, abdica de dirigir diretamente o universo, de ser onipresente e de ter habitação no coração dos homens. Escolhe desempenhar estas funções indiretamente, através das ações do Pai e do Espírito Santo.
Um texto curioso que talvez sintetize tudo isso está em João 16:7-8: “Convém-vos que eu vá, porque, se eu não for, o Consolador [Espírito Santo] não virá para vós outros; se, porém, eu for, eu vo-lo enviarei. Quando ele vier, convencerá o mundo do pecado, da justiça e do juízo”. Em outras palavras, Jesus estava dizendo que a função dele era morrer, ressuscitar e partir. A função do Espírito Santo era adentrar corações e orientar pessoas ao convencimento do pecado, da justiça e do juízo. Se ele não fosse, o Espírito não cumpriria a missão dele. Jesus demonstra ali que as funções entre as pessoas da Trindade eram bem definidas e não seriam modificadas.
Há outro texto interessante, que complementa o que estou dizendo. Está em João 14:16-17, onde Jesus diz: “E eu rogarei ao Pai, e Ele vos dará outro Consolador, a fim de que esteja para sempre convosco, o Espírito da Verdade…”. Mais uma vez, o que Jesus mostra é que havia um terceiro membro na divindade. Este membro não era Jesus, pois Jesus iria embora e este era “outro Consolador”. Também não era o próprio Pai, porque Ele seria dado pelo Pai (Jesus não diz que pediria ao Pai para vir pessoalmente, mas para enviar a outrem) Por quê? Porque a função deveria ser desempenhada por uma terceira pessoa na divindade, não por Jesus, nem pelo Pai.
Concluímos, portanto, que o sacrifício de Jesus implica numa divisão de funções entre as pessoas que compõem a divindade. E uma vez que ao Pai coube a manifestação de si mesmo em glória e a direção do universo, era necessário haver ainda uma terceira pessoa divina, o Espírito Santo, responsável por fazer o que não era função nem de Jesus Cristo, nem do Pai.
3) A exclusividade do cristianismo:
A necessidade da morte Cristo implica, finalmente, no fato de que o cristianismo é a única religião verdadeira e coerente. Não será necessário muitas linhas para explicar a razão. Em nenhuma outra religião existe uma solução efetiva para o problema do ser humano com o pecado. No judaísmo e no islamismo, Deus não se sacrifica pelo homem para perdoar seu pecado. Ele age simplesmente perdoa, destoando com a justiça. Ele é o “pai-delegado” que solta o filho da cadeia sem pagar a fiança. É um Deus que contradiz sua natureza e que é acusado pelo diabo por ser parcial e injusto. É um Deus que não consegue equilibrar justiça e amor paternal. E o homem, por sua vez, permanece sem o perdão perante a justiça. Seu perdão é falso, ilegítimo, ilusório. Ninguém pagou o preço pelo pecado. Ninguém o comprou das mãos de Satanás.
No espiritismo, no budismo e no deísmo, Deus também não se sacrifica; e ao próprio ser humano é delegada a tarefa de vencer o problema do pecado, alcançar o perdão e se tornar santo, como se fazer coisas boas anulassem nossos erros ou nossa condição de pecador. O homem do espiritismo e do budismo é elevado a um ser autossuficiente, que pode pagar sua dívida para com Deus e mudar sua própria natureza. Ignoram-se nessas religiões todos os empecilhos práticos e até lógicos para se efetivar isso fazem do homem deus para si mesmo.
Na religião das testemunhas de Jeová, Deus salva através de Jesus Cristo, mas Jesus Cristo não é Deus. Assim, temos um Deus que se esconde de se sacrificar pelo homem, enviando alguém que nada tem a ver com a situação. Morre, então, um justo e tal morte é inútil, pois não serve para salvar-nos.
Enfim, nenhuma religião apresenta o correto remédio para o problema do pecado. É só no cristianismo que encontramos um Deus capaz de efetivamente perdoar o homem, sem transgredir a justiça, sem contradizer sua natureza, sem delegar a outrem a punição pelo crime do homem. É apenas no cristianismo que encontramos salvação verdadeira, plena, inquestionável. É só no cristianismo que encontramos o ser humano colocado em seu devido lugar: no lugar de pecador impotente, que nada pode fazer para resolver sua relação com Deus a não ser esperar por uma ação do próprio Deus que o possibilite ser salvo e o dê forças para buscar a santidade.
Com efeito, o cristianismo é a religião mais realista que existe. Você pode achar que ela não é verdadeira. E talvez ela não seja mesmo. Mas se não é, nenhuma outra é. Agora, se ela é verdadeira, não há outro caminho. Não há coerência fora do cristianismo. Não há coerência fora do sacrifício deste homem.
Por Davi Caldas
Fonte: Reação Adventista