Poderia estar errado o início da Era Cristã?

Gostaria de entender a informação contida em Lucas 2:2-4: Como Jesus teria nascido no ano 1 da Era Cristã se José e Maria foram a Belém para o censo quando Quirino era governador da Síria, no período de 6 a 9 depois de Cristo? – A. P. T.

Tanto quanto saibamos, o único censo havido no governo de Quirino, na Síria, documentado fora da Bíblia, é aquele referido por Flávio Josefo, historiador judeu (em Antiguidades XVIII, 26 [ii.1]), o qual, segundo ele, ocorreu em 6 d.C. Conforme essas informações, Jesus teria nascido no ano 6 da Era Cristã. Diante disso, como fica a credibilidade de Lucas e da Bíblia quanto à menção de dados históricos?

O Evangelho de Lucas nos mostra quanto esse evangelista foi cuidadoso com respeito aos dados históricos mencionados por ele. Com certeza, estão corretos aqueles que chamam o escrito dele “o evangelho da certeza histórica”. Essa certeza também se dá com respeito ao governo de Quirino sobre a Síria e o recenseamento havido em seus dias, que fez com que José e Maria fossem a Belém para o alistamento (que nada tinha que ver com eleição, mas com a cobrança de impostos por parte de Roma).

Uma possível solução para a informação de Lucas 2:2 é o fato de que o vocábulo “primeiro” (prôtos, no grego) também tem o sentido de “anterior” – uso comprovado por textos do Novo Testamento, como Hebreus 9:2 e João 1:15, 30. Desse modo, o texto de Lucas 2:2 poderia ser lido assim: “Este recenseamento ocorreu antes daquele que foi feito sob Quirino, governador da Síria.” Ou seja, Lucas estaria mencionando um censo ocorrido antes do realizado pelo governador Quirino, em 6 d.C.

No entanto, se tomarmos o vocábulo prôtos com o significado de “primeiro”, então, o censo mencionado por Lucas indicaria que Quirino realizou dois censos na Síria-Judeia, em dois períodos distintos, a pedido de César Augusto. Teria ocorrido um antes da Era Cristã, no fim do governo de Saturninus e no início do governo de Varus (Sentius Saturninus foi o governador da Síria de 9 a 6 a.C., sucedido por Quintilius Varus, que continuou no ofício até depois da morte de Herodes, o Grande, ocorrida em abril do ano 4 a.C.), e outro censo em 6 d.C. Esse último seria aquele mencionado por Flávio Josefo e também em Atos 5:37. Assim, Jesus teria nascido nos dias do primeiro censo, ou seja, por volta de 5 antes da Era Cristã.

Há boas razões para acreditarmos que o governador Quirino esteve duas vezes em posição de comando sobre a província da Síria, que incluía a Judeia como uma subdivisão política. A descoberta de inscrições latinas fortalece a ideia de que Quirino esteve em posição de autoridade sobre a Síria em duas ocasiões (SDABC, v. 5, p. 241), sendo que, na primeira, ele liderou uma campanha contra os Homonadensianos, montanheses da Pisídia, durante o período entre 12 e 2 a.C.

Então, se Jesus nasceu por volta do ano 5 antes da Era Cristã, houve um equívoco ao se datar Seu nascimento no ano 1 dessa mesma era? Estaria a Era Cristã com um atraso de cinco anos? A resposta é sim.

Desafortunadamente, ao escolher uma data para o início do calendário cristão, o abade Dionísio Exiguus (morto por volta de 550), em seu Cyclus Paschalis escolheu o 754 AUC (ano da fundação de Roma), em vez de 749 AUC, data mais acurada para o nascimento de Cristo. Mateus, em seu evangelho (2:1), declarou que Jesus nasceu “nos dias de Herodes, o rei”. Josefo, em suas Antiguidades (18.6.4), mencionou um eclipse no ano 750 AUC, antes da morte de Herodes. Pelo fato de o assassinato dos bebês israelitas e a fuga para o Egito terem precedido a morte de Herodes, isso nos remete a 749 AUC, ou cerca de 5 a.C., para a data do nascimento de Jesus. Os judeus, em João 2:20, disseram que o templo tinha levado 46 anos para ser edificado. Josefo e o historiador romano Dio Cassius colocaram 733 AUC como a data em que a construção do Templo começou. [Então 733+46=779 AUC, ano da conclusão do Templo]. De acordo com Lucas 3:23, Jesus tinha “cerca de trinta anos”, que, subtraídos de 779, dá 749, ou 5 a.C., como a data mais aceitável para Seu nascimento, ou seja, cerca de cinco anos mais cedo do que a nossa datação da Era Cristã (Cairns, E. E. O Cristianismo Através dos Séculos: Uma História da Igreja Cristã, p. 38, 39).

É bom saber que as informações históricas contidas na Bíblia são plenamente dignas de crédito. Mais importante ainda é compreender e aceitar o imenso presente de Deus ao ser humano, ou seja, o envio de Seu Filho, Jesus Cristo, como sacrifício substitutivo em nosso lugar. Em face de tão grande amor, o mínimo que devemos fazer é, com espírito de gratidão, aceitar o oferecimento divino da salvação, conseguida graças ao Infante de Belém, que nasceu para morrer, para que você e eu pudéssemos viver.

Autor:  Ozeas C. Moura, doutor em Teologia Bíblica e professor no Salt Unasp, campus Engenheiro Coelho. 

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Sobre Weleson Fernandes

Evangelista da Igreja Adventista do sétimo dia, analista financeiro, formado em gestão financeira, pós graduado em controladoria de finanças, graduado em Teologia para Evangelistas pela Universidade Adventista de São Paulo. Autor de livros e de artigos, colunista no Blog Sétimo dia, Jovens Adventista. Tem participado como palestrante em seminários e em Conferências de evangelismo. Casado com Shirlene, é pai de três filhos.

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