O crescimento evangélico brasileiro continua. As estatísticas não mentem. Atletas, artistas, donas-de-casa, empresários, funcionários públicos e aposentados, lotam igrejas dos grandes centros urbanos.
Contudo, junto com essa expansão somam-se vários problemas como mistura doutrinária, arrefecimento ético, vaidades ministeriais e politicagens internas.
É visível a crise dos púlpitos. O besteirol que assola as pregações faz qualquer um arrepiar. Um pastor, querendo incentivar sua congregação a contribuir para uma construção, valeu-se de Gênesis 11:6 – “Eles são um só povo e falam uma só língua, e começaram a construir isso. Em breve nada poderá impedir o que planejam.” Parece que ele nem levou em conta que este versículo se refere ao malfadado plano de construir a torre de Babel.
Asneiras desse tipo não aconteciam antigamente. Os pastores pioneiros sabiam dar “boa razão” da fé, conheciam a Bíblia profundamente e dominavam a homilética. Os evangelistas arrebatavam auditórios com eloqüência e eram tribunos que articulavam seus pensamentos com graça e sabedoria.
A banalização que invade os arraiais evangélicos surpreende porque os primeiros missionários chegaram ao Brasil com a proposta de gerar uma classe pensante que transformasse a cultura.
A maioria deles aportou por aqui com formação nos bons seminários americanos e europeus que sabiam dialogar com os ideais iluministas. Eles acreditavam que uma nação venceria a miséria se calcasse seu progresso em sólidos alicerces bíblicos e acadêmicos.
Foi devido a essa mentalidade que os primeiros líderes evangélicos se preocuparam em implantar excelentes escolas de ensino médio e universitário.
No final do século XIX, presbiterianos e metodistas já haviam inaugurado o Mackenzie e o Colégio Piracicabano – considerados referências para o governo federal que tentava melhorar a qualidade do ensino brasileiro. Essa estratégia missionária representava fielmente o espírito protestante que deseja dar aos fiéis bons fundamentos teológicos para o livre exame das Escrituras.
Percebe-se essa preocupação até na letra dos antigos hinos. Os primeiros crentes louvavam com músicas que continham uma densidade doutrinária inquestionável. De lá para cá, o louvor, infelizmente, empobreceu tanto que, hoje, a maioria dos cânticos não passa de chavões reciclados.
O culto protestante não depende tanto de ritos e símbolos como o católico. Na missa, a homilia não ocupa uma grande fatia de tempo, pois existem outras liturgias mais significativas – como a transubstanciação, por exemplo. Já os evangélicos, que defendem o discurso e a informalidade litúrgica, se quiserem manter sua relevância, precisam dar maior prioridade à pregação. Caso o sermão seja esvaziado, restará pouca solidez para que o movimento sobreviva na história.
Para que os crentes não se percam com tanta irrelevância é preciso resistir aos apelos da mídia. Segundo Marshall McLuhan, “o meio é a mensagem.” Isto é, quando se opta por um veículo de comunicação, implicitamente, escolhem-se também os conteúdos que se quer transmitir.
A mensagem do Evangelho precisa da comunicação de verdades que carecem de tempo para reflexão, pois cobram decisões. Por exemplo, quando um pastor escolhe a televisão como o meio exclusivo para anunciar o Evangelho, ele também está escolhendo restringir os conteúdos de sua pregação – diante de câmeras, ele precisará valer-se de frases curtas, pensamentos pouco reflexivos e lógicas simplistas.
Para que os crentes não se amesquinhem é preciso fugir do pragmatismo. O evangelho não pode ser reduzido a pequenas receitas triunfalistas. Vivemos numa sociedade inundada de manuais que ensinam “como” alguma coisa. A mensagem do Evangelho, porém, é nobilíssima e precisa ser diferenciada das filosofias que só prometem sucesso. Lamento observar que muitas igrejas estejam se transformando em centros de autoajuda.
Para que os crentes não se nivelem por baixo é necessário recordar o legado daqueles que marcaram sua geração como Jonathan Edwards, Charles Finney, Nelson Mandela, Martin Luther King, Jimmy Carter e tantos outros. Essa gente sofreu muito para que a integridade da mensagem cristã fosse preservada – o testemunho deles não pode ser desprezado.
O cenário evangélico nacional é desanimador, mas não desesperador. Portanto, convoco meus irmãos para arregaçarem suas mangas. O tempo urge, mais ainda é possível deixar um bom testemunho para a próxima geração.
Soli Deo Gloria.
Autor: Ricardo Gondim