Participa Satanás da expiação?

O texto de Levítico 16:10 é claro em afirmar que o bode emissário participa da expiação. Se esse bode representa Satanás, isso significaria sua participação na expiação ao lado de Cristo?

O texto em questão afirma: “O bode sobre que cair a sorte para bode emissário [azazel] será apresentado vivo perante o Senhor, para fazer expiação [kaphar] por meio dele e enviá-lo ao deserto como bode emissário” (Lv 16:10).

A palavra “Azazel” só ocorre nesse texto de Levítico e tem sido objeto de muita discussão entre os eruditos bíblicos. Diversos significados têm sido propostos para o termo: um lugar no deserto, “bode emissário”, um demônio do deserto, ou o próprio Satanás. No pseudepígrafo 1 Livro de Enoque (8:1; 10:12; 13:1), Azazel é o chefe dos anjos caídos.

Uma análise do papel dos dois bodes no ritual do Dia da Expiação aponta para Azazel como um ser pessoal, em oposição ao Senhor (Yahweh): um bode era “para o Senhor”- um ser pessoal (Lv 16:8), o outro “para Azazel” (Lv 16:8) – que, em oposição ao Senhor, deve ser também um ser pessoal. O bode “para o Senhor” era sacrificado (Lv 16:15) – representando o sacrifício de Cristo; o outro bode era enviado ao deserto (Lv 16:20-22) – representando Satanás, que, durante o Milênio, vagará pela Terra desolada e desértica (Ap 20:1-3).

Assim, sendo Azazel símbolo de Satanás, como entender, em Levítico 16:10, a expressão “para fazer expiação [kaphar] por meio dele”? Se esse bode não era imolado em sacrifício, como participa da expiação?

Frank B. Holbrook, em sua obra O Sacerdócio Expiatório de Jesus Cristo (Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 2002), na página 143, argumenta, com propriedade, que o vocábulo “expiação” (kaphar) tem mais de um significado na Bíblia:

1. Expiação em sentido “redentivo”, Isso se dava quando o pecado do penitente era perdoado e apagado por meio da morte de um substituto. Essa expiação redentiva é a mencionada em Levítico 4:34- 35: “Então, o sacerdote, com o dedo, tomará do sangue da oferta pelo pecado e o porá sobre os chifres do altar do holocausto. […] Assim, o sacerdote, por essa pessoa, fará expiação [kaphar] do seu pecado que cometeu, e lhe será perdoado.” O mesmo tipo de expiação era feito com o sangue do “bode para o Senhor” (Lv 16:15-19). Essa expiação “redentiva” era símbolo da que é efetuada pelo precioso sangue de Cristo, “como de cordeiro sem defeito e sem mácula” (1 Pe 1:19).

2. Expiação em sentido “punitivo”, quando o pecador perde a vida devido ao castigo por seus delitos. No livro de Números, ocorrem dois exemplos de expiação “punitiva”:

1) quando o imoral simeonita Zimri e sua parceira sexual Cosbi foram atravessados com uma lança pelo sacerdote Fineias (ver Nm 25:6-18). É dito que, com a morte desses dois pecadores impenitentes, se fez “expiação [kaphar] pelos filhos de Israel” (Nm 25:13);

2) quando um homicida era executado por seu crime (ver Nm 35:16, 30-33). Com isso, Deus deixou claro que “o sangue profana a terra; nenhuma expiação [kaphar] se fará pela terra por causa do sangue que nela for derramado, senão com o sangue daquele que o derramou” ( Nm 35:33).

Esse tipo de expiação punitiva é a que acontecia com o bode emissário (Lv 16:10), o qual levava sobre si, não vicariamente, mas punitivamente, os pecados confessados, perdoados e apagados do povo de Israel. O bode Azazel é símbolo apropriado de Satanás, autor e instigador de todo o pecado, o qual levará sobre si, durante mil anos,
os pecados que fez o povo de Deus cometer.

Interessante é que Ellen G. White também fala em expiação nos aspectos “punitivo” e “redentivo”:

“Visto que Satanás é o originador do pecado, o instigador direto de todos os pecados que ocasionaram a morte do Filho de Deus, exige a justiça que Satanás sofra a punição final. A obra de Cristo para a redenção dos homens e purificação do Universo da contaminação do pecado será encerrada pela remoção dos pecados do santuário celestial e deposição dos mesmos sobre Satanás, que cumprirá a pena final. Assim no cerimonial típico, o ciclo anual do ministério encerrava-se com a purificação do santuário e confissão dos pecados sobre a cabeça do bode emissário. Em tais condições, no ministério do tabernáculo e do templo que mais tarde tomou o seu lugar, ensinavam-se ao povo cada dia as grandes verdades relativas à morte e ministério de Cristo, e uma vez ao ano sua mente era transportada para os acontecimentos finais do grande conflito entre Cristo e Satanás, e para a final purificação do Universo, de pecado e pecadores” [Patriarcas eProfetas, p. 358 [grifos acrescentados]).

E então, participa Satanás da expiação? A resposta é “sim”, se levarmos em conta a expiação “punitiva”, e “não”, se temos em vista a expiação “redentiva”, a qual é feita somente através de Jesus Cristo e seu precioso sangue.

Por Ozeas C. Moura, doutor em Teologia Bíblica e editor na Casa Publicadora Brasileira.


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Sobre Weleson Fernandes

Evangelista da Igreja Adventista do sétimo dia, analista financeiro, formado em gestão financeira, pós graduado em controladoria de finanças, graduado em Teologia para Evangelistas pela Universidade Adventista de São Paulo. Autor de livros e de artigos, colunista no Blog Sétimo dia, Jovens Adventista. Tem participado como palestrante em seminários e em Conferências de evangelismo. Casado com Shirlene, é pai de três filhos.

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