Por que Deus proibia o casamento com outros povos?

O Casamento Inter-Racial na Bíblia

Quando o foco de observação é casamento inter-racial, segundo a perspectiva bíblica, pode-se perceber claramente que Deus não legislou proibindo o casamento inter-racial, tendo em vista apenas a questão racial. 

Deus proibiu terminantemente o casamento de israelitas com pessoas que não professavam fé nEle, como Deus criador do céu e da terra (Dt 7:1-4). A razão para tal proibição é apresentada: “pois fariam desviar teus filhos de mim, para que servissem a outros deuses; e a ira do Senhor se acenderia contra vós, e depressa vos consumiria” (Dt 7:4). O problema não era a raça ou a nacionalidade, mas a idolatria dos povos cananeus.

Encontram-se nas Escrituras diversos exemplos de casamento entre israelitas e não israelitas sem qualquer restrição divina, desde que o não israelita houvesse se convertido ao Deus de Israel. O próprio Jesus teve ancestrais não israelitas, como Tamar, Raabe, Rute e Bateseba (Mt 1:5, 6).

O Casamento de Moisés com Zípora

“E falaram Miriã e Arão contra Moisés, por causa da mulher cusita, que tomara; porquanto tinha tomado a mulher cusita” (Nm 12:1). Outra versões bíblicas, como a Almeida Revista e Atualizada e a King James trazem etíope em lugar de cusita.

Jeremias deixa transparecer (Jr 13:23) que a cor dos etíopes era escura. Os egípcios referiam-se a eles como “negros”.  Não há dúvida de que Zípora tinha uma ascendência negra. Este fato permite concluir, pelo silêncio divino em não proibir a união de Moisés com uma mulher estrangeira e de pele mais escura, que é inadequado impedir o casamento de um homem e uma mulher cristãos pela simples razão de serem de etnias diferentes.

Análise dos Conselhos de Ellen White Sobre Casamento Inter-Racial

A igreja adventista, no seu contexto norte-americano, recebeu alguns conselhos de Ellen White sobre casamento entre pessoas brancas e negras. A seguir a primeira citação:

Mas há uma objeção ao casamento da raça branca com a preta. Todos devem considerar que não têm o direito de trazer a sua prole aquilo que a coloca em desvantagem; não têm o direito de lhe dar como patrimônio hereditário uma condição que os sujeitaria a uma vida de humilhação. Os filhos dêsses [sic] casamentos mistos têm um sentimento de amargura para com os pais que lhes deram essa herança para tôda [sic] a vida. Por esta razão, caso não houvesse outras, não deveria haver casamento entre as raças branca e de côr. 

Diante do acima exposto, pergunta-se: que fator determina “desvantagem” e “uma vida de humilhação”? Acaso Ellen White concordava com as teorias racistas que consideravam o negro como inferior e degenerado? A resposta depende de uma análise do seu pensamento sobre a raça negra.

No próprio conselho sobre casamento misto ela demonstra que brancos e negros tem os mesmos direitos, quando diz, “devemos tratar o homem de côr com o mesmíssimo respeito com que tratamos o branco”.  Quanto a degradação sofrida pela raça negra nos Estados Unidos da América ela diz que foi a escravidão, com todas as suas implicações sociais que a determinou:

Quem foi que manteve esse povo em servidão? Quem os conservou em ignorância?… Se a raça se degradou, se são repulsivos nos hábitos e maneiras, quem os fez assim? Não lhes deve muito a gente branca? Depois de tão grande injustiça lhes haver sido feita, não se deveria envidar sério esforço por erguê-los? A verdade tem de ser-lhes levada. Eles tem almas a serem salvas, assim como nós. 

O que acima foi citado precisa ser analisado no contexto para aqueles a quem ela escreveu – os irmãos e obreiros dos EUA. Sua mensagem buscava despertar o interesse dos irmãos para a evangelização dos negros dos Estados do Sul, que até então estavam sendo negligenciados. Esta negligência estava intimamente ligada ao preconceito racial dos brancos contra os negros. 

A referida degradação dos negros americanos não se devia a sua origem africana ou a sua cor, mas a escravidão conduzida pelos brancos. Continuando sua mensagem aos adventistas norte-americanos ela diz: “Cristo veio a esta Terra com uma mensagem de misericórdia e perdão. Ele colocou o fundamento para uma religião onde judeus e gentios, brancos e pretos, livres e presos, são unidos numa irmandade comum, reconhecidos como iguais à vista de Deus”. 

A primeira citação, já discutida, apareceu em 1896, contudo, outra, datada de 1912 também merece consideração:

Em resposta a indagações quanto à inconveniência de casamento entre jovens cristãos de raças branca e preta, direi que nos princípios de minha obra esta pergunta me foi apresentada, e o esclarecimento que me foi dado da parte do Senhor foi que êsse [sic] passo não deveria ser dado; pois é certo criar discussão e confusão. Tenho tido sempre o mesmo conselho a dar. 

Nenhuma animação deve ser dada a casamentos dessa espécie entre nosso povo. Que o irmão de côr se case com uma irmã de côr que seja digna, que ame a Deus e guarde os Seus mandamentos. Que a irmã branca que pensa em unir-se em matrimônio a um irmão de côr se recuse a dar tal passo, pois o Senhor não está dirigindo nessa direção. 

É natural que se questione: por quê não deveria haver casamento entre brancos e pretos? O que Ellen White escreveu é um conselho aplicável a qualquer país ou trata-se de uma recomendação local? 

A Revista Adventista de julho de 1986 publicou uma consulta feita ao pastor José Maria B. Silva sobre estes conselhos de Ellen White. Eis sua posição: trata-se “apenas [de] uma recomendação com caráter local para uma situação específica no tempo em que ela viveu”. 

Um breve exame das situações envolvendo as relações entre brancos e negros nos escritos de Ellen White permite que se perceba o foco da questão – seus conselhos não partiam de princípios racistas, vigentes na época, mas estavam voltados para as reações que tais uniões matrimoniais pudessem despertar num país racialmente dividido entre brancos, negros e índios.

Os irmãos adventistas não estavam imunes aos preconceitos locais. Além de impedir a aceitação de casamento entre brancos e pretos, este mesmo preconceito produzia uma negligência missiológica. Simplesmente os negros não estavam sendo atingidos pelos esforços da igreja.

Falando sobre a necessidade de se atingir os negros com o evangelho, disse Ellen White:

Mas grande cuidado deve-se ter ao demonstrar-se esforço para erguer este povo. Entre a raça branca em muitos lugares, existe um grande preconceito contra a raça negra. Nós podemos desejar ignorar este preconceito, mas não podemos fazê-lo. Se nós agíssemos como se esse preconceito não existisse, nós não obteríamos luz perante este povo. Nós devemos enfrentar a situação como ela é, e sábia e inteligentemente tratar com ela. 

Mas, ainda permanece uma questão: por quê deveria a igreja adventista nos EUA adaptar-se à condição de preconceito racial existente no país? A próxima citação oferece uma resposta:

O povo de cor não deveria solicitar com insistência para que sejam colocados em igualdade com o povo branco. A relação das duas raças tem sido um assunto difícil de ser tratado, e eu temo que há de permanecer um tema muito complexo. Tanto quanto possível, todas as coisas que possam suscitar o preconceito das pessoas brancas deveria ser evitado. Há perigo de fechar a porta de tal modo que nossos obreiros brancos não sejam aptos a trabalhar em alguns lugares do Sul. 

A seguir destaca-se alguns pontos decorrentes da citação: (1) os negros norte-americanos estavam procurando ser colocados em nível de igualdade com os brancos, o que em si estava em harmonia com a Bíblia e com a Constituição, que estabelece direitos iguais para todos, mas esbarrava no preconceito dos brancos em relação aos negros; (2) deveria ser evitado o preconceito das pessoas brancas; (3) era necessário prudência por parte dos missionários adventistas ao pregar o evangelho em alguns lugares do Sul. 

A última citação analisada é deveras proveitosa para a compreensão do motivo do conselho contrário ao casamento entre brancos e pretos. Visto que o negro reivindicava uma posição de igualdade com o branco e esta lhe era recusada por causa do forte preconceito existente, seria prejudicial para a obra da evangelização o incentivo, ou a aceitação de uniões inter-raciais, pois era através do casamento com brancos que os negros podiam atingir a igualdade de condições.

Como já foi anteriormente demonstrado, Ellen White combatia a teoria de que o negro fosse inferior ao branco. Ele não era inferior, nem deveria ser tratado como tal, mas da mesma forma cortês pela qual o branco merecia ser tratado.

Após ter-se empreendido uma análise histórica e bíblica fica evidente que o conselho de Ellen White sobre casamento entre brancos e pretos era apropriado à realidade social norte-americana da época, e não à igreja adventista brasileira atual, devido às amplas diferenças sociais que distinguem EUA e Brasil.

Por: Prof. Natanael B. P. Moraes SALT

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Sobre Weleson Fernandes

Evangelista da Igreja Adventista do sétimo dia, analista financeiro, formado em gestão financeira, pós graduado em controladoria de finanças, graduado em Teologia para Evangelistas pela Universidade Adventista de São Paulo. Autor de livros e de artigos, colunista no Blog Sétimo dia, Jovens Adventista. Tem participado como palestrante em seminários e em Conferências de evangelismo. Casado com Shirlene, é pai de três filhos.

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