Jejum como Estilo de Vida

A prática do jejum como disciplina espiritual é defendida pelos mais diferentes segmentos religiosos. Até nas religiões pagãs antigas era praticado como forma de preparo para o encontro com uma divindade. Acreditava-se que essa experiência proporcionava uma abertura para a influência divina [1].

Além dos cristãos, outros grupos continuam com essa prática em nossos dias. Dentre esses segmentos, podemos destacar os seguidores de Maomé, que promovem o jejum no mês de Ramadã, quando comemoram a entrega do Alcorão por Alá.

No cristianismo, o jejum é praticado de diferentes maneiras e por motivos diversos. Em meio a essa diversidade, precisamos entender o que é e o que não é jejum, a relevância desse rito no ministério de Cristo, qual é seu sentido amplo e a importância dessa disciplina em nosso preparo diário para o encontro com Cristo.

O que o jejum não é

Para que não nos sintamos confusos na exposição desse ensino bíblico, vamos mostrar em que não consiste o jejum na visão bíblica.

1. Não é penitência (expiação de pecado, sacrifício para se livrar de culpa, aflição, tormento ou ato para demonstrar que alguém é mais santo do que o outro). A Bíblia deixa claro que o perdão e a purificação vêm pelo arrependimento, confissão e abandono do pecado, e só existe um Ser que pode fazer isso por nós. A Palavra diz: “Se confessarmos os nossos pecados, Ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça” (ljo 1:9).

2. Não é ritual público de tristeza para mostrar superioridade. Nos dias de Cristo, era comum os fariseus jejuarem para mostrar uma fachada de “santidade”. O que mostravam no exterior não correspondia ao que estava no interior, pois o coração deles estava longe de Deus. O Salvador foi ao ponto em Seus ensinos para que não caiamos no mesmo erro. Ele afirmou: “Quando jejuardes, não vos mostreis contristados como os hipócritas; porque desfiguram o rosto com o fim de parecer aos homens que jejuam. Em verdade vos digo que eles já receberam a recompensa” (Mt 6:16).

3. Não é greve de fome. O jejum não deve ser usado para chamar a atenção de Deus e das pessoas para nossos objetivos e metas. O contexto de Isaías 58 mostra claramente isso. No verso 3, o profeta descreve o clamor dos “grevistas”: “Por que jejuamos nós, e Tu não atentas para isso? Por que afligimos a nossa alma, e Tu não o levas em conta?” Por que o que eles faziam não era aceito? No fim do verso vem a resposta: “Eis que, no dia em que jejuais, cuidais de vossos próprios interesses e exigis que se faça todo o vosso trabalho.”

É importante compreender essas coisas porque o que já se viu no passado se repete em nossos dias. O Espírito de Profecia diz: “É verdade que há pessoas com mente desequilibrada, que se consideram muito religiosas e que impõem a si mesmas jejum e oração com prejuízo de sua saúde. Essas pessoas se deixam enganar. Deus não requereu isso delas. […] Confiam em suas boas obras para a salvação e estão procurando comprar o Céu por obras meritórias próprias em vez de, como deve todo pecador, depender somente dos méritos de um Salvador crucificado e ressurreto.” [2]

Em que consiste o jejum

O sentido teológico do jejum transcende o significado de se abster de alimento por determinado período de tempo. “O jejum é a oração do corpo.” [3] É o momento em que o corpo se priva daquilo de que gosta e se entrega, sem reserva, à comunhão íntima com o Criador e Salvador.

Essa comunhão se desenvolve na presença de Deus, ouvindo Sua voz por meio da Bíblia e em oração, reagindo ao que Ele fala. Nesse relacionamento diferenciado, podemos notar o verdadeiro sentido do jejum. A palavra profética diz: “O espírito do verdadeiro jejum e oração é o espírito que rende a Deus mente, coração e vontade.” [4]

O jejum pode ser completo ou parcial. O completo é aquele em que a pessoa se abstém de todo tipo de alimento por certo período de tempo. No jejum parcial, a pessoa faz uso de frutas frescas, sopas, caldos, sucos naturais nos horários normais das refeições. O uso de água deve ser normal em qualquer opção de jejum.

O jejum no ministério de Cristo

Logo depois do batismo e antes de começar Seu ministério, Jesus jejuou quarenta dias e quarenta noites. “O grande objetivo por que Cristo suportou aquele longo jejum no deserto, foi ensinar-nos a necessidade da abnegação e da temperança.” [5]

Por meio da abnegação e da temperança, Ele pôs sob controle o apetite e mostrou que não havia desculpa para a queda de Adão e Eva pela simples satisfação do apetite. Assim, onde eles falharam, Cristo venceu e deixou o sublime exemplo de que não há desculpa para nenhum seguidor Seu quebrar o relacionamento por meio do pecado.

Não foi sem lutas e dificuldades que Ele venceu e subjugou o apetite e suas paixões humanas. Satanás usou as mesmas armas que levaram nossos pais à queda, [6] mas Ele Se firmou no poder da Palavra e disse: “Não só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que procede da boca de Deus.” [7]

Com essas palavras, Cristo deixa clara a receita para a vitória sobre as confederações satânicas nos momentos mais extremos e no cotidiano – comunhão com Deus por meio do estudo da Bíblia, oração e jejum. Foi assim que Ele viveu e venceu a cada dia.

Sentido amplo do jejum

O capítulo 58 de Isaías explica esse conceito ampliado do jejum, jejuar é mais do que se abster de alimento; é uma disciplina que aprofunda o compromisso com um estilo de vida segundo o modelo de Cristo. Ele viveu como amigo de todas as pessoas e classes; amava todos e Seu amor ia além de palavras.

“O Salvador misturava-Se com os homens como uma pessoa que lhes desejava o bem. Manifestava simpatia por eles, ministrava-lhes às necessidades e granjeava-lhes a confiança. Ordenava então: ‘Segue-Me’” (Io 2L19). [8]

Aqui está o modelo de como se deve viver Isaías 58, especialmente os versos 6, 7 e 13. O Espírito de comunhão, compaixão e amor, esse sentimento que acompanha a pessoa enquanto está em jejum, deve acompanhá-la em todos os seus relacionamentos sociais, familiares, de trabalho e na vida em geral. O jejum só faz sentido quando nos projeta para uma vida de santificação antes, durante e depois.

A disciplina do jejum deve ser praticada tendo em vista nosso preparo diário para o encontro com Cristo. A orientação profética para os nossos dias é: “Agora e daqui por diante até ao fim do tempo, deve o povo de Deus ser mais fervoroso, mais desperto, não confiando em sua própria sabedoria, mas na sabedoria de seu Líder. Devem pôr de parte dias de jejum e oração. Pode não ser requerida a completa abstinência de alimento, mas devem comer moderadamente, do alimento mais simples.” [9]

A disciplina habitual do jejum aliada ao objetivo do SEE, que visa a desenvolver e consolidar o hábito de buscar a Deus na primeira hora de cada manhã, pode ser uma grande bênção tanto para o corpo como para a alma. Eilen G. White diz: “É impossível avaliar os bons resultados de uma hora ou mesmo de meia hora diária dedicada à Palavra de Deus” [10] e à oração. Outro conselho oportuno: “jejuar um dia por semana lhes proporcionaria incalculável benefício.” [11]

Podemos afirmar com segurança que o caminho para o preparo diário para o encontro com Cristo a qualquer momento passa pela comunhão e o jejum de forma habitual.

Referências

1. Colin Brown, Novo Dicionário Internacional de Teologia do Nouo Testamento (Vida Nova: São Paulo, 1982).
2. Eilen G. White, Testemunhos Para a Igreja, v. 3, p. 172,173.
3. Madeline S. Johnston, “Jejum com equilíbrio”, Ministério, maio/ junho de 1995.
4. Eilen G. White, Conselhos Sobre o Regime Alimentar, p. 189.
5. Conselhos Sobre Saúde, p. 125.
6. No Deserto da Tentação, p. 52.
7. Mateus 4:4.
8. Ellen G. White, Benejjcência Social, p. 60.
9. Eventos Finais, p. 82.
10. Conselhos Sobre a Escola Sabatina, p. 42.
11. Conselhos Sobre o Regime Alimentar, p. 189.

Texto de autoria de Miguel Pinheiro, diretor do Departamento de Mordomia Cristã da Divisão Sul-Americana da IASD. Publicado na RA de Mai/2010.


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Sobre Weleson Fernandes

Evangelista da Igreja Adventista do sétimo dia, analista financeiro, formado em gestão financeira, pós graduado em controladoria de finanças, graduado em Teologia para Evangelistas pela Universidade Adventista de São Paulo. Autor de livros e de artigos, colunista no Blog Sétimo dia, Jovens Adventista. Tem participado como palestrante em seminários e em Conferências de evangelismo. Casado com Shirlene, é pai de três filhos.

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