O número de divórcios dentro da Igreja anda cada vez mais parecido com o número de divórcio fora dela. Isso explica, sem dúvida, porque quando condeno o divórcio, com a minha habitual visão rígida e tradicional, se levantam vários para me dizer coisas como: “Você pensa assim porque não é casado, não sabe como é difícil”, ou “Você é novo ainda”, ou, claro, “Você não deve julgar”. É difícil pregar os preceitos de Deus no mundo cristão pós-moderno. Precisamos provar que a grama é verde. E às vezes falhamos miseravelmente no convencimento.
O fato óbvio aqui é que minha pouca experiência ou o fato de eu não ser casado (ainda) nada tem a ver com a assertiva: “Deus odeia o divórcio” (Ml 2:16). É Deus quem fala, não eu. Quando alguém se irrita comigo por conta de algo que Deus disse, sustentando que eu não entendo, que eu estou agindo como juiz, só posso concluir que ela não entende o que é preceito de Deus. Natural. No pós-modernismo, tudo é opinião. Se eu digo que Deus odeia o divórcio, entende-se que essa é minha opinião das coisas não a visão de Deus. A autoridade divina foi para o ralo.
Eis o que a Igreja fez: comprou os discursos e visões do mundo sobre as coisas. Por isso tem dificuldade em ouvir a verdade. No que diz respeito a casamento e divórcio, o primeiro passou a ser visto de modo bem negativo. É um fardo, é difícil, é uma prisão, cuidado! A independência se tornou um deus, aliás. “Você não precisa de um esposo”, “Você não precisa de uma esposa”, “Viva seus sonhos”, “Conquiste sua estabilidade financeira”, “Não se prenda a alguém”, “Ame a si mesmo”. E eu fico aqui me perguntando se essa opção pela independência inclui celibato, castidade e serviço ao Senhor… Não, né? Deixa pra lá.
A extensão dessa funesta ópera são os filhos. “Mais um filho? Cruz credo!”, “Nossa!”, “Maluco!”, “Maluca!”. No mínimo, a notícia de mais um filho tem gerado aquele sorriso zombeteiro e as palavras: “Corajoso” (um eufemismo mentiroso para: “Péssima ideia, rapaz!”). É o país, a situação financeira difícil, a crise. Criança faz gastar tempo, dinheiro, paz. Tenha um e olhe lá! Depois dos trinta só.
O divórcio, por sua vez, passou a ser visto de modo extremamente leniente. Claro! Se o casamento é tão pesado, tão difícil, tão tenebroso, então o divórcio só pode ser pintado com as mais coloridas cores. Ninguém pode falar nada contra. “Você não sabe o que o casal passava”.
O cristianismo pós-moderno causa riso. Ele já não se baseia mais na Bíblia, naquilo que diz o Senhor, mas na experiência pessoal. Quando alguém me diz que eu não sei o que é ser casado, que eu sou jovem, etc., está dizendo que sua base não é a Sagrada Escritura, mas a experiência. Se a experiência de muitas pessoas (sobretudo a minha) diz que o casamento é difícil e o divórcio justificável, então é. E não há Bíblia Sagrada que mude isso. Vivemos a era do “Sola Experiência”. Pós-modernismo puro.
Esse evangelho do achismo, da opinião própria, do “assim digo eu mesmo” é um gerador de covardes. Para o cristão moldado com essa visão, sempre será preferível apontar erro nas instituições divinas do que em si mesmo. Daí a leniência com o divórcio. Se eu caso, minha vida vira um inferno e me divorcio, em vez de assumir que errei, que a culpa foi minha, prefiro dizer que é a instituição divina do matrimônio que é difícil demais. O problema nunca está em mim.
E isso serve para justificar qualquer fracasso meu. Fracassei em me manter virgem até o matrimônio? Então, o problema está na ideia de castidade. Ela não é possível, porque eu não consegui. Logo, eu não estou errado. Se eu fracasso em não trair, é a fidelidade que é impossível. O problema não está em mim. Torno-me minha própria medida. Aonde eu erro, o ato deixa de ser erro. O princípio e a proibição é que passam a ser o problema.
Estou certo que sempre que abordo esses temas, os críticos pensam: “Quero ver quando casar e acabar se divorciando. Vai dizer o quê?”. Essa pergunta só faz sentido justamente porque nós, cristãos submersos no pós-modernismo, já achamos natural não reconhecer os próprios erros. Nos acostumamos à covardia. O que eu faria? Não sei. O que eu deveria fazer caso me divorciasse? Ser homem (e cristão) o suficiente para dizer: “Eu errei. Eu fui incapaz de escolher bem minha esposa ou de colocar em prática os princípios bíblicos requeridos por Deus para eu manter o casamento. A culpa é minha, não da instituição. O casamento continua sendo uma benção maravilhosa e algo possível. O divórcio continua sendo errado e odioso. Fui eu quem errou”. Qual pós-moderno tem coragem de assumir esse ônus? Não ouço nem o som do grilo.
Toda a argumentação do cristianismo pós-moderno não é bíblica, mas mundana. E não só mundana, mas, por vezes, esquerdista. “Você não é casado pra saber” é uma versão do “Você não é mulher para poder opinar sobre o aborto e o feminismo”. E o “Você não sabe o que passou o casal” é uma tentativa de conversão da exceção à regra, tal como acontece nos apelos de abortistas aos casos de aborto por estupro, anencefalia e risco de morte para a mãe. Em outras palavras, assim como é uma minoria os casos de aborto pelas circunstâncias supracitadas (a maioria é por mera irresponsabilidade dos pais), também é uma minoria os casamentos que não dão certo por razões realmente relevantes. O divórcio ocorre em peso hoje por “incompatibilidade de gênios”. Simplesmente “acabou o amor”.
Dentre os casos realmente complicados, como o de violência doméstica e ciúmes doentios, na maioria deles tais comportamentos já eram perfeitamente visíveis antes do casamento. Então, por que raios a pessoa se casou? O divórcio não começa no momento em que o casal assina os papéis da separação. Ele começa no momento em que ataques de ciúmes durante a fase do namoro são desconsiderados na avaliação sobre a viabilidade de um casamento; no momento em que agressões físicas e verbais são tidas como aceitáveis; no momento em que a experiência sexual se mostra mais relevante para o casal que uma espera santa até o matrimônio; no momento em que Deus é retirado do primeiro lugar; no momento em que no lugar da Bíblia, adota-se o famigerado “eu acho”.
Não, o problema não está no casamento, mas no casal, nos indivíduos, na relação para com Deus e para com o outro. Não, a dificuldade não é o casamento. Qualquer convívio, qualquer relação, possui desafios, pois requer menos egoísmo e mais disposição para amar. Então, não é o matrimônio que é o obstáculo; é o evangelho; é ser cristão.
O casamento nada mais é que ser cristão em todo o tempo. É amar o próximo no nível hard, já que você terá que dormir ao lado dele à noite e dividir todas as coisas. Então, se seu casamento vai mal, talvez seja porque você e/ou seu cônjuge não estão sabendo ser cristãos em todo o tempo. A questão, portanto, vai muito mais além de matrimônio. Você talvez esteja encontrando dificuldade em ser cristão ou em ser cristão num nível mais profundo.
Eu me recuso com todas as forças a supor que o problema esteja no casamento. Afinal, se cremos de fato que tudo o que Deus fez é bom (para o seu devido fim), que a Bíblia é a sua santa Palavra e que nós somos pecadores, então qualquer problema que houver no meu matrimônio só pode ser culpa minha e/ou do meu cônjuge. É por essa razão que casamento deve ser visto como algo sério, mas pelo ângulo certo. Ele é sério não porque é ruim, ou quase impossível, mas porque para dar certo é preciso seguir exatamente as regras de Deus.
Se vou casar, portanto, o que preciso aprender (e devem me ensinar) não é que casamento é muito difícil, mas que uma esposa e um esposo devem ser, acima de tudo, parceiros espirituais um do outro, com o firme propósito de seguir a Deus em tudo e de cuidar um do outro para sempre. É isso que você encontrou no seu ou na sua pretendente? Case. É isso que você e seu cônjuge continuam fazendo todos os dias desde que se casaram? Então, não há como dar errado. Desvie-se de Deus e seus princípios num desses dois processos e aí sim, o que o mundo diz do matrimônio será realidade na sua vida. A escolha é sua: vai comprar o discurso do mundo e arruinar a sua vida e de outras pessoas? Ou ficará com o bom e velho: “Assim diz o Senhor”? Eu já fiz minha escolha.
Por Davi Caldas
Fonte: Reação Adventista