A pandemia do Coronavírus, pela qual o mundo tem passado desde o início do ano (e a China desde final de 2019), me despertou para uma questão curiosa. Nenhum dos governos das dezenas de países afetados pelo vírus iniciou uma campanha incentivando uma reforma na saúde. Não estou falando de uma reforma no sistema nacional de saúde, mas sim de uma reforma pessoal, uma reeducação nos hábitos de saúde das pessoas. Ministérios de saúde mundo afora, com seus quadros compostos por médicos, sequer ventilaram a ideia de que para reduzir a agressividade e letalidade do vírus, hábitos mais saudáveis (sobretudo alimentares) são essenciais. Se você nunca pensou por esse ângulo, te convido a refletir sobre algumas coisas.
Uma vez que ainda não se desenvolveu uma medicação totalmente eficaz e certa contra o Covid-19, como muitas pessoas pegaram a doença ficaram curadas? Através do sistema imunológico. Quando qualquer vírus ou bactéria maléfica entra no organismo, o sistema imunológico começa a produzir anticorpos para combater o invasor. Isso ocorre diariamente. Estamos expostos continuamente a vírus e bactérias e se não caímos doentes todos os dias é porque o corpo não para de trabalhar em nossa defesa.
No entanto, para que esse sistema de defesa funcione de maneira eficaz e rápida, é essencial manter uma alimentação apropriada e outros bons hábitos como expor-se ao sol, fazer exercícios físicos, respirar ar puro, beber bastante água, ir dormir até no máximo dez horas da noite, ter um bom relacionamento com as pessoas à volta, tratar problemas psicológicos/emocionais (se necessário com a ajuda de profissionais), manter ao menos um dia inteiro de descanso por semana (do trabalho e estudos) e cultivar uma boa saúde espiritual. Se uma ou mais dessas áreas estiver sendo maltratada, o sistema terá maior dificuldade de defender nosso corpo de ataques microbióticos.
E a pergunta que fica é: a humanidade, no geral, tem cuidado de sua saúde? Ela tem dado ao sistema imunológico o que é necessário para ele desempenhar bem o seu papel de defensor? Ou será que nós, humanos, temos dado ao corpo os piores alimentos e os mais terríveis hábitos? A resposta, de acordo com o que vejo à minha volta e com o que diversos estudos estatísticos atestam, é um sonoro “não”. Então, aqui, já é possível perceber que uma das principais causas do vírus estar matando tanta gente não está sendo estimulada a ser combatida.
A medicina, embora possua diversos estudos que muitas vezes se contradizem, gerando assim linhas de pensamento distintas, parece possuir ao menos um consenso: uma alimentação mais natural e um conjunto de hábitos que priorize aquilo para o qual nosso corpo foi (ou parece ter sido) projetado nos traz maior saúde e, portanto, aumenta o potencial de prevenção e cura de doenças. Para quem crê em Deus (no sentido teísta), nenhuma novidade. Se existe um ser transcendente, onipotente, racional e bom que criou o universo e a espécie humana é lógico que na natureza, em termos de nutrição, haverá tudo o que nós precisamos; e que nosso corpo, sendo um projeto inteligente, deverá ser usado de acordo com esse projeto.
O fato do mais natural ser melhor para saúde é uma das evidências que considero mais belas da existência de Deus. Talvez não seja a mais filosófica (em termos de silogismo e complexidade do argumento), mas me traz uma sensação de admiração e respeito por Deus bastante peculiar. Note: numa cosmovisão ateísta, tudo o que existe é fruto de acaso; movimentação aleatória de átomos e moléculas, ao longo de bilhões de anos, produzindo sem intenção a natureza e o ser humano. E, curiosamente, a aleatoriedade cega (perdão pelo pleonasmo) fez com que, seguindo uma dieta e outros hábitos mais naturais, o ser humano viva melhor. Por outro lado, a intencionalidade humana na fabricação de certos alimentos e no cultivo e certos hábitos, gerou problemas. Parece haver uma inversão: o acaso projeta mais inteligentemente que a intenção. Não faz sentido para mim.
Numa cosmovisão teísta, no entanto, fica claro que a dieta e os hábitos mais naturais são bons porque foram intencionalmente criados por uma mente mais racional e pura que a nossa. Temos pernas, braços, músculos e ossos porque fomos projetados para nos movimentar (não passar o dia inteiro sentados de frente para uma tela iluminada que mostra imagens virtuais). A terra gira, fazendo o sol “nascer” e “se pôr” todos os dias, porque, entre outras coisas, fomos projetados para pegar um pouco de sol durante o dia e descansar durante a noite. A fotossíntese das plantas existe porque nós precisamos respirar e elas, por sua vez, se nutrirem. Ao se nutrirem, as plantas e árvores crescem e também nos servem de alimento (folhas e frutos). Esse alimento contém tudo o que o corpo humano precisa em termos de nutrientes. Assim, quanto mais planta e árvore, melhor. Quanto mais terra, melhor. Quanto mais ar puro, melhor. Quanto mais luz do sol e água fresca, melhor.
A incrível conexão entre cada parte da natureza é uma evidência bela e formidável da existência de Deus, mas também da superioridade de hábitos mais naturais. E os fatos inversos estão aí para fortalecer essa constatação. Ninguém mantém uma boa saúde consumindo excessiva e regularmente açúcar refinado, pizza, macarrão, sorvete, bolos doces, frituras, refrigerantes, sucos industrializados, café, bebidas alcoólicas, a farinha de trigo modificada que é vendida em diversos países do ocidente, incluindo o Brasil (a qual possui 400 vezes mais glúten que o normal), o soro de leite “longa vida” cheio de conservantes, a carne de animais doentes e maltratados, o camarão cheio de toxinas, o porco cheio de bactérias, o morcego cheio de coronavírus.
Ninguém mantém boa saúde desprezando a enorme variedade de frutas, legumes e verduras, fugindo do sol, enfurnado em casa ou no escritório o ano inteiro, dormindo duas horas da manhã todos os dias e só fazendo exercício vez ou outra quando corre atrás do ônibus para não perdê-lo (quase morrendo do coração por isso). Ninguém mantém boa saúde tendo apenas amigos virtuais e tentando vencer seus problemas sem ajuda de amigos, família e Deus.
Infelizmente, a humanidade comprou as ideias de Satanás. É ele quem nos diz que todas as frutas, verduras e legumes do imenso Jardim do Éden não são tão boas quanto o fruto proibido. A mentira pegou com Eva. E pega conosco até hoje. Com o paladar viciado, modificado, deturpado, achamos mesmo que uma vida comendo sorvete todos os dias tem mais graça que uma vida comendo frutas. E é surpreendente quando pessoas passam por um mês de desintoxicação de besteiras e percebem que o paladar passa a apreciar grandemente as coisas naturais. “Quem diria que uma banana ou uma uva eram tão saborosas!? Não é que o negócio é bom?!”.
É Satanás quem nos diz que trabalhar o corpo é chato, que o sacrifício não vale a pena, que ficar doente é normal, que se adoecer é só tomar um remédio artificial (ou, se não tiver, esperar que ele seja criado). E veja: não estou demonizando os remédios e tratamentos criados pelo ser humano. Glórias a Deus por eles! O Criador deu ao homem inteligência para formular soluções em todas as áreas, incluindo a médica. E isso têm salvado muitas pessoas. Mas será mesmo que devemos maltratar o corpo e esperar as doenças virem (ou melhor, pedir para elas virem) para então remediar com aquilo que é artificial? Lembre-se que, em geral, os remédios artificiais resolvem um problema, mas tornam seu corpo propenso a outros. Não seria melhor prevenir para não precisar chegar ao ponto de precisar remediar? Até porque nem sempre os remédios serão suficientes para resolver os problemas de um corpo debilitado por maus hábitos de saúde.
Aqui é importante ressaltar algo: essas reflexões não intentam nos levar à posição radical e infundada de que, cuidando da saúde, nunca ficaremos doentes. Muito menos à ideia perigosa de que cuidando da saúde ninguém morreria de Coronavírus. Vivemos em um mundo mau. O pecado enfraqueceu nossos organismos. Mesmo bons hábitos de saúde podem, em alguns casos, não ser suficientes para impedir rapidamente a ação de um vírus poderoso ou resolver doenças causadas por problemas genéticos, radiação ou fortes traumas emocionais. Por isso, repito: o trabalho dos médicos e cientistas no desenvolvimento e sugestão de remédios artificiais é muito importante. Mas ainda assim, a reflexão permanece: devemos depender só disso? Se as pessoas cuidassem bem da saúde, será que essa pandemia existiria ou seria tão terrível? Penso que não.
E o que a Bíblia tem a nos dizer sobre tudo isso? A Bíblia, esse compêndio fantástico de obras inspiradas pelo Criador, não só fala sobre a história do povo de Deus, pecado, preceitos morais e salvação por meio do sacrifício de Cristo. Ela também oferece princípios para várias áreas da vida, desde a financeira até a de saúde. Embora não seja um compêndio de natureza e objetivo científicos (no sentido dado ao termo científico nos dias de hoje), seu conteúdo faz sentido e nos abre o entendimento para muitas questões. Vejamos.
A dieta original do ser humano era vegetariana (Gn 1:29-30 e 2:8-15). Tanto porque não havia derramamento de sangue, quanto porque a carne não é o melhor dos alimentos para o organismo. Ela é mais pesada, mais demorada para digerir e mais ácida que frutas, legumes, verduras e grãos. Além disso, dada a abundância de frutos, o clima ameno (sem extremos) de uma Terra perfeita e a ausência de trabalho esgotante, a carne era mesmo um item desnecessário. O homem tinha o que precisava.
O advento do dilúvio mudou bastante o panorama, tornando necessário que, em alguns contextos, o ser humano pudesse se alimentar de carne. A morte já existia desde a queda e os sacrifícios de animais também. Deus, então, libera o alimento cárneo, mas com restrições. A distinção entre animais puros e impuros para consumo é dada a conhecer ao ser humano (Gn 7:2-9 e 8:20) e a carne com sangue é proibida (Gn 9:3-4). É notável como tais restrições ocorrem bem antes de existir Moisés, a nação israelita e mesmo Abraão. Isso indica que elas não deveriam se limitar ao povo judeu, mas servir de principio para o ser humano.
A característica de linguagem religiosa dada a regulamentos de saúde na Torá (os cinco primeiros livros da Bíblia, vulgo Pentateuco), não implica que os princípios eram meramente ritualísticos. Um exemplo claro disso está em Deuteronômio 23:12-14, onde lemos:
“Também haverá um lugar fora do acampamento [do exército de Israel], para onde irás. Dentre as tuas armas terás um porrete; e, quando te abaixares fora, cavarás com ele e, volvendo-te, cobrirás o que defecaste. Porquanto o Senhor, teu Deus, anda no meio do teu acampamento para te livrar e para entregar-te os teus inimigos; portanto, o teu acampamento será santo, para que ele não veja em ti coisa indecente e se aparte de ti”.
A linguagem fala de indecência e santidade, mas fica bastante claro que o objetivo de Deus era proteger o exército de infecções. A lei era higiênica. Da mesma forma, a quarentena para quem estava com lepra ou outras doenças de pele potencialmente contagiantes visava impedir uma contaminação em massa (Lv 13:1-4, 45-46). A distinção entre carnes e a abstenção de sangue (Lv 11 e 17; Dt 14), seguindo essa linha, cumpria dupla função de saúde: (1) impedia o consumo de carnes que, por natureza ou circunstâncias, tinham maior potencial de causar doenças e (2) servia de princípio-base para a ideia de que devemos tomar cuidado com o que ingerimos. Esse princípio será repetido no Concílio de Jerusalém, por meio da regra da abstenção de sangue, sendo estendido para os gentios como um lembrete a ser guardado (At 15:20-21).
Digno de nota é o fato de Daniel e seus amigos terem mantido e aumentado boa saúde por meio de uma dieta vegetariana e sem álcool. A abstenção das carnes e vinhos do rei Nabucodonosor e a opção pelas comidas mais naturais (Dn 1:5-16) foram abençoadas por Deus, resultando em melhor aparência, vigor e inteligência por parte dos quatro hebreus (Dn 1:17-21). Se, por um lado, o elemento sobrenatural não pode ser descartado aqui, por outro lado, o potencial da alimentação mais natural é plausível concluir que a alimentação dos jovens teve peso porque realmente é superior. E parece claro que se a dieta natural é superior, Deus tenderá a abençoar com mais saúde os que procuram praticá-la.
A Bíblia Sagrada também fala contra os vícios alimentares, incluindo o alcoolismo (Rm 13:13; Lc 21:34; Gl 5:21; I Pd 4:3; Is 5:11; Pv 23:31-32 e 31:4-5). E nunca é demais refletir sobre o fato de que a primeira tentação se relacionou à comida (Gn 2:15-17 e 3:1-19). Os nossos primeiros pais escolheram o fruto proibido em vez dos diversos frutos permitidos. Como resultado, acabaram perdendo o mais importante de todos os frutos: o fruto da árvore da vida (Gn 3:22-24). Quando, portanto, nos entregamos à má alimentação estamos repetindo, guardadas as devidas proporções, a conduta de Adão e Eva, que preferiram o que fazia mal ao que fazia bem. Não parece sábio.
Contrariando essa postura irresponsável, a Bíblia nos incentiva a manter o nosso corpo íntegro (I Ts 5:23), a não destruí-lo (I Co 3:16-17) e a cuidar bem de tudo quanto Deus nos deu para administrar (Mt 25:14-30 e Lc 19:12-27). Ela também nos lembra que fomos criados por Deus à sua imagem e semelhança (Gn 1:26-27), comprados por Cristo Jesus na cruz (I Co 6:20) e tornados templo do Espírito Santo, de modo que não pertencemos a nós mesmos (I Co 3:16, 6:19; II Co 6:16). Baseados nisso, não faria sentido maltratar nosso corpo físico, nossas emoções e nosso intelecto. Deus não quer ser Senhor apenas de nossa vida moral/espiritual. Ele quer ser Senhor de cada parte de nossa vida. E, por mais estranho que isso possa parecer, é essa total servidão a Deus que nos gera liberdade e bem-estar verdadeiros. Os princípios de Deus revelados por meio da Bíblia, da lógica e até da ciência não são correntes de escravidão, mas muralhas contra o mal. Tivessem Adão e Eva obedecido a Deus e preferido a árvore da vida e todas as demais, o mundo estaria plenamente feliz e em paz hoje.
E então voltamos ao Covid-19. Se chineses não tivessem comido morcego, animal portador do vírus, provavelmente não haveria pandemia. E se toda a humanidade cuidasse da saúde, seguindo os princípios bíblicos, nenhum vírus poderoso (seja o Covid-19 ou qualquer outro) teria tamanha letalidade. Com imunidade alta em todos os organismos humanos, seria raro alguém vir a falecer ou ter muitas complicações por causa de vírus e bactérias maléficas. Milhares de vidas poderiam ter sido poupadas.
Que governos têm falado sobre isso? Nenhum. Que igrejas têm pregado os princípios bíblicos de saúde? Poucas. Uma ou outra igreja faz campanhas específicas às vezes para a prevenção de determinadas doenças, bem como combate a fumo e alcoolismo. Mas nada que seja muito amplo, sistemático e constante. E aqui entra o ponto incômodo da realidade para algumas pessoas: o único movimento cristão de abrangência mundial que tem pregado uma mensagem bíblica de reforma da saúde é a Igreja Adventista do Sétimo Dia.
Não deixa de ser curioso como, a despeito da relevância prática do tema e da base bíblica e lógica, muitos cristãos ainda considerem isso como besteira e até mesmo legalismo. Alguns chegam ao ponto de dizer que a reforma de saúde como dever cristão é uma invenção de Ellen White. Mas embora Ellen White tenha enfatizado muito esse ponto e recebido visões a respeito, até um descrente em Deus concordará que cuidar da saúde é algo relevante. Se um ateu que se importa com a própria vida tem motivos para cuidar da saúde, quanto mais nós, cristãos, não é mesmo? Não deveríamos honrar ao Deus Criador em todas as áreas de nossas vidas? Ou será que Deus é mais honrado quando chumbamos nosso corpo, adquirindo doenças desnecessárias, envelhecendo mais rápido, sendo impedidos de trabalhar mais na obra de Deus, gerando empecilhos para os outros e morrendo mais jovem?
Parece-me claro, portanto, que os escritos de Ellen White sobre saúde são apenas repetição e aplicação de algo que já está acessível na Bíblia e na razão humana. E isso é motivo de júbilo, não? Deus usou uma serva para nos incentivar a ir para a Bíblia e perceber que cuidar do corpo e da mente são princípios bíblicos. Por que não aceitar a relevância dessa mensagem para os dias finais da história? É difícil sustentar que a vontade de Deus seja milhares de mortes por Coronavírus em vez da prevenção e da cura através de melhores hábitos de saúde.
Por Davi Caldas
Fonte: Reação Adventista