Série “Existência de Deus” – Parte 8: Argumento da Ressurreição

O argumento da ressurreição se difere dos demais até agora expostos nessa série por ser de caráter histórico. Ele pretende demonstrar que Jesus ressuscitou por meio de evidências históricas. Se isso for fato, então, obviamente, Deus existe. E mais: tudo o que Jesus disse é verdadeiro, o que evidencia a veracidade da Bíblia. Podemos resumir o argumento da seguinte forma:

1) Existem pelo menos seis grandes fatos históricos comprovados sobre a vida de Jesus: (a) sua existência; (b) sua morte em uma cruz; (c) seu sepultamento em uma tumba de José de Arimatéia; (d) a constatação da tumba vazia ao terceiro dia de sua morte; (e) os diversos testemunhos sobre suas aparições após a morte; (f) a crença dos primeiros discípulos na ressurreição;

2) os três últimos fatos carecem de explicação. Por que Jesus não estava no túmulo em que fora posto? Como o corpo saiu de lá? Como várias pessoas puderam ver Jesus após a sua morte? Por que surgiu a crença de que Jesus havia ressuscitado? É necessário achar uma explicação plausível para todos essas questões;

3) a melhor explicação, que abrange todos os pontos e é mais provável dentre as demais, é a de que Jesus ressuscitou.

Como já dito, isso é um resumo. Vamos destrinchar o argumento a seguir.

Fatos históricos e critérios de confiabilidade

O argumento da ressurreição se inicia afirmando que há alguns fatos históricos sobre Jesus que são aceitos pela maioria dos historiadores. Entretanto, devemos saber o que são fatos históricos antes de qualquer coisa. Fatos históricos são aqueles que podem ser atestados através de documentos históricos. Eles se diferem de outros fatos porque podem ser afirmados com um mínimo de certeza. Por exemplo, como podemos ter certeza que Pedro Àlvares Cabral chegou ao Brasil em 22 de Abril de 1500? Através de uma série de documentos da época que nos ajudam a recompor esses fatos.

Entretanto, apenas a existência de documentos não são suficientes para dizer que um evento realmente aconteceu. É necessário saber se os documentos são confiáveis, para então considerá-los históricos. Afinal, é possível que um documento da época de um evento seja apenas um relato mítico, uma lenda, uma mentira. Como podemos saber se um documento, de fato, é confiável? Há pelo menos dez critérios que são utilizados pelos historiadores para averiguar isso. Por uma questão de espaço, não vou explicá-los detalhadamente. Isso ficará para outra postagem. Apenas os passarei por alto. Os relatos de um fato são confiáveis na medida em que passam bem pela maioria desses critérios:

1) Descrição detalhada do contexto (tempo, lugar, conjuntura política e econômica, costumes, cultura, religião, idioma, religião, principais pessoas, etc.);

2) Múltiplas comprovações (documentos escritos por indivíduos diferentes falando sobre o mesmo fato);

3) Antiguidade (proximidade do fato narrado);

4) Constrangimento (existência de fatos constrangedores ou embaraçosos para o autor do documento ou pessoas próximas);

5) Ausência de benefícios (para o autor do documento);

6) Dissimilaridade (existência de pontos no relato que causa escândalo, irritação e até rejeição por parte da maioria das pessoas da época e lugar publicado);

7) Concordância básica (entre os vários documentos que atestam um fato e entre as várias cópias de cada documento);

8) Citações próximas (o conteúdo do documento é citado em outros documentos de datação próxima ao fato ocorrido);

9) Comprovação inimiga (o conteúdo do documento é reafirmado em escritos de autores que são inimigos);

10) Citação de testemunhas (o documento é escrito por testemunhas, ou cita os nomes das testemunhas de determinado fato, ou oferece a localização das testemunhas para o leitor, ou ainda, lembra aos leitores que o fato teve testemunhas, incentivando-os a irem procurar essas testemunhas para argui-las).

Analisando os fatos do Novo Testamento

Expostos os critérios, é possível agora buscar aplicá-los sobre os documentos que relatam os seis fatos sobre Jesus mencionados acima. Só para lembrar, os seis fatos são: (a) a existência de Jesus; (b) a sua morte numa cruz; (c) o seu sepultamento em uma tumba pertencente a José de Arimatéia; (d) a constatação, três dias depois, de que a tumba estava vazia; (e) os relatos das aparições de Jesus após a morte; (f) a crença dos primeiros cristãos de que Jesus havia ressuscitado.

A) A existência de Jesus: Este fato é confirmado não só pelos documentos de autores cristãos que viveram no primeiro século, mas também por diversos autores não cristãos (a maioria, inclusive, bem hostil ao cristianismo) que, em seus escritos, citaram um homem judeu chamado Jesus que pregou uma nova filosofia, que foi morto em uma cruz e que gerou o movimento cristão. Não há espaço para pôr os escritos aqui (o farei em breve em uma série de postagens sobre quem foi Jesus), mas posso citar os autores.

A começar pelos autores não-cristãos, temos os escritos do historiador judeu Flávio Josefo (37 d.C – 100 d.C); do historiador romano Cornélio Tácito (55 d.C – 120 d.C); de Caio Plínio II, governador da Bitínia (61 d.C – 114 d.C); de outro historiador romano chamado Suetônio (69 d.C – 141 d.C); do escritor satírico Luciano de Samósata (125 d.C – 181 d.C), etc. Há ainda os comentários de Talmudes Judaicos (que eram códigos de discussões rabínicas), nos quais Jesus é citado em alguns trechos, sempre apontado como um judeu apóstata e herege que não deveria ser seguido.

Aqui vemos que os critérios para confiabilidade das fontes foram muito bem encontrados já nas fontes não-cristãs. São documentos antigos, múltiplos, coerentes nas informações principais, que relatam eventos dentro de contextos históricos, escritos por adversários dos cristãos (judeus e pagãos) que não tinham o mínimo interesse em defender o cristianismo, etc.

Quanto aos autores cristãos, temos os escritos de pelo menos 8 autores diferentes no Novo Testamento (Mateus, Marcos, Lucas, João, Paulo, Tiago, Pedro e Judas), que são os documentos mais antigos que temos sobre Jesus. Além desses, temos os escritos dos primeiros teólogos da Igreja (chamados de “pais da Igreja”) que chegaram a viver em parte do primeiro século. Entre eles, Clemente, Inácio, Policarpo, Papias e outros.

Os “céticos” leigos costumam a criticar o estudo desses documentos escritos por cristãos, dizendo o seguinte: “Eles não são dignos de confiança porque foram escritos pela parte interessada. Ou seja, eram beneficiados com os relatos que faziam. Por isso, devem ter inventado todos esses relatos”. Só que esses “céticos” esquecem que os primeiros cristãos não foram beneficiados em nada ao escrever e divulgar esses relatos.

Quem lê o Novo Testamento e estuda um pouco de história, sabe que os cristãos do primeiro, segundo, terceiro e início do quarto século, foram fortemente hostilizados por judeus (de onde vieram) e por pagãos. Havia perseguição física, prisões, martírio, tortura e morte. Propagar o cristianismo nos primeiros séculos era, em muitos casos, como propogar o cristianismo em países anti-cristãos hoje como a Coréia do Norte e a Arábia Saudita. Não há benefícios para quem propaga essas ideias nesses países.

Tal como os escritos não cristãos supracitados, os documentos do NT e dos pais da Igreja, como podemos ver, satisfazem bem os critérios de confiabilidade (aplique cada um deles e veja por si só). Portanto, concluímos que a existência de Jesus é um fato histórico inegável, motivo pelo qual a maioria dos historidores, cristãos ou não, concorda com isso.

B) A morte de Jesus em uma cruz: Do mesmo modo que documentos cristãos e não-cristãos do primeiro e segundo século atestam que Jesus existiu, também atestam que ele foi condenado à morte de cruz e assim morreu. Todos os nomes que citamos na avaliação acima, ao falarem de Jesus, citaram essa sua morte condenatória. Deste modo, os critérios de contexto histórico, multiplicidade, ausência de benefícios, comprovação inimiga e todos os outros que já vimos se aplicam também a este fato. Portanto, a morte de Jesus em uma cruz também é inegável historicamente.

C) O sepultamento em uma tumba de José de Arimatéia: Este fato é atestado explicitamente pelos quatro evangelhos e implicitamente pelo apóstolo Paulo. Ou seja, é um fato atestado por documentos antigos e múltiplos. Fora isso, dificilmente os cristãos da época inventariam esse sepultamento em uma tumba pertencente a José de Atimatéia, em primeiro lugar, porque era desonroso que alguém não fosse sepultado na tumba de sua própria família. Em segundo lugar, porque José de Arimatéia era um membro do Sinédrio (o tribunal religioso judaico que condenou Jesus).

Se já era vergonhoso para os seguidores de Jesus verem seu mestre ser sepultado em uma tumba de alguém que não era seu familiar, muito mais vergonhoso e odioso era para os discípulos ver seu mestre sendo posto em uma tumba de alguém que fazia parte do tribunal que matou. Tal história, portanto, jamais seria inventada por nenhum autor cristão da época. Se tal fato foi relatado é porque ele realmente ocorreu.

D) A tumba vazia: A constatação da tumba vazia, três dias após o sepultamento de Jesus, é relatada também pelos evangelhistas e por Paulo em diversas cartas. Mas a lógica é igualmente importante para a confiabilidade desse relato. Se Jesus não tivesse sumido da tumba, ninguém sairia espalhando por aí que Jesus ressuscitou. A certeza da ressurreição de Jesus entre seus seguidores surge, em primeiro lugar, pela constatação da tumba vazia. Da mesma orma, sem tumba vazia, os líderes judaicos não precisariam criar uma explicação para este fato, como o fizeram (Mt 28:11-15).

Há outro detalhe que evidencia a tumba vazia. Os quatro evangelistas afirmam que as primeiras testemunhas deste fato foram mulheres (dentre elas, Maria Madalena, com um passado vergonhoso). O problema é que no contexto judaico da época as mulheres não tinham valor como testemunha. Se os evangelistas tivessem inventado a história do túmulo vazio, é muito provável que não colocariam mulheres como as primeiras testemunhas. Isso não só iria contrariar o pensamento patriarcal e machista da época (o que é improvável que autores de índole mentirosa fizessem), como seria faria o relato ser menos propenso a ser aceito. Mas, se mesmo sendo contrário ao pensamento da época, constrangedor para os seguidores homens e um ponto desfavorável em sua pregação, ainda assim, o relato das mulheres como testemunha do túmulo vazio foi feito pelos escritores, isso mostra que eles estavam sendo sinceros. O fato ocorreu.

E) Os testemunhos das aparições de Cristo: As aparições de Cristo após a sua morte são relatadas explicitamente pelos quatro evangelistas e por Paulo. Segundo eles, várias pessoas viram Jesus após morto, num período de 40 dias. São citados como tendo visto Jesus após a morte Maria Madalena e mais um grupo de mulheres, Pedro e mais os outros discípulos, dois seguidores de Jesus no caminho de um vilarejo chamado Emaús, Tiago (um dos irmãos de Jesus), o apóstolo Paulo e cerca de mais 500 pessoas.

Vários pontos desses relatos dão credibilidade ao fato. Primeiro, temos múltiplos relatos de que diversas pessoas diferentes viram Jesus após a morte. Se fosse apenas um relato, talvez pudéssemos dizer que foi uma invenção. Se o relato tivesse sido escrito muito tempo depois do fato, poderíamos dizer que não é confiável. Se o relato não des-crevesse um contexto histórico, poderíamos apontá-lo como mito. Mas o que nós temos são múltiplos relatos, coerentes em suas informações principais, com um contexto muito bem definido e escritos praticamente na mesma época dos eventos. Ou seja, não há nada aqui que nos leve a crer que tais relatos não são confiáveis.

Segundo, os relatos dizem que diversas pessoas viram Jesus após sua morte. Se fosse uma ou duas, ou mesmo meia dúzia, não ao mesmo tempo, poderíamos dizer que foram alucinações. Só que, no total, foram mais de 500 pessoas que o viram após a sua morte. E na maioria das suas aparições, havia sempre mais de uma pessoa presente. Não podemos dizer que se tratou de diversas alucinações coletivas. Ora, alucinações não são efeitos psicológicos coletivos nos quais todas as pessoas de um lugar veem exatamente a mesma coisa. Alucinações são individuais porque cada um tem seu próprio cérebro e suas próprias sensações. Ou seja, as pessoas desses relatos realmente devem ter visto Jesus após a sua morte.

Terceiro, o apóstolo Paulo em sua primeira carta aos Coríntios 15:3-5, não só oferece o nome de algumas das testemunhas das aparições de Jesus, afirmando ainda que mais de 500 pessoas chegaram a vê-lo de uma só vez, mas também atesta que a maioria dessas pessoas ainda vivia quando ele escreveu a carta (ou seja, um convite para o leitor investigar se realmente os fatos eram verídicos).

Quarto, não havia motivo para que os primeiros seguidores de Jesus inventassem suas aparições. Eles não iriam ganhar dinheiro ou status. E mesmo que tivessem feito isso apaenas por orgulho, para limpar o nome de seu mestre, que havia sido condenado injustamente, isso não explica o porquê persistiram nessa mentira a ponto de sofrerem e morrerem por ela. Na verdade, não faz sentido acreditar que o cristianismo logrou êxito em meio a tantas e terríveis perseguições baseado em um fato que mais de 500 pessoas sabiam que era mentira. Ainda mais quando nos lembramos que essas pessoas criam em Deus. Ou seja, se estivessem mentindo, sabiam que Deus as cobraria por isso.

Bem, tudo isso mostra que, de fato, muitas pessoas experimentaram aparições de Jesus após a sua morte, inclusive alguns dos próprios autores desses documentos. E os critérios, como o leitor está vendo, estão sendo satisfeitos nesses relatos.

F) A crença na ressurreição de Jesus entre os discípulos: Este é o último fato que vamos analisar. Como os outros, ele também é inegável historicamente. É atestado por todos os documentos que compõem o Novo Testamento, assim como por todos os documentos escritos pelos pais da Igreja e também por documentos de alguns daqueles autores não cristãos que citamos na análise do primeiro fato. De fato, o próprio Paulo afirma que a crença na ressurreição de Jesus é motivo pelo qual o cristianismo passou a existir (I Co 15:12-19); e a pregação dos primeiros cristãos era centrada justamente neste ponto – Jesus ressuscitou dentre os mortos.

Então, não há dúvida de que os discípulos de Jesus e os primeiros cristãos, desde cedo mantiveram a crença de que Jesus ressuscitara dentre os mortos. Este é o motivo pelo qual o cristianismo começou a existir. E em que se baseava essa crença? Ora, ela se baseava na constatação do túmulo vazio pelos discípulos e nas aparições que eles e várias pessoas experimentaram juntas, em diversas ocasiões. Como os relatos das aparições e do túmulo vazio são confiáveis, então a crença sincera dos discípulos na ressurreição de Jesus também é confiável. Tratam-se de fatos históricos.

Ou seja, o relato da crença na ressurreição de Jesus entre os primeiros cristãos é confiável por se basear em outros fatos confiáveis que levaram os discípulos a terem tal crença e também porque o próprio relato da crença em si satisfaz os critérios de confiabilidade, tais como: multiplicidade dos relatos, antiguidade das fontes, coerência nas informações principais, citação de testemunhas, comprovação inimiga e etc. Não existem motivos plausíveis para se opor ao relato dessa crença.

Agora, a grande questão é: Qual é a melhor explicação para esses fatos? Porque o leitor deve notar que até agora eu não concluí que Jesus ressuscitou. Eu apenas citei os fatos históricos de que Jesus existiu, foi morto em uma cruz, sepultado, a sepultura foi encontrada vazia três dias depois, várias pessoas experimentaram visões dele após a morte e, por causa disso, os discípulos passaram a crer em sua ressurreição. Esses são os fatos. São inegáveis. Mas a partir desses fatos, posso concluir que Jesus ressuscitou?

É aqui que entramos na segunda premissa do argumento. Lembra-se dela? Diz assim: tais fatos históricos necessitam de uma explicação. Por que Jesus não estava no túmulo em que fora posto? Como o corpo saiu de lá? Como várias pessoas puderam ver Jesus após a sua morte? Por que surgiu a crença de que Jesus havia ressuscitado? É necessário achar uma explicação plausível para todos essas questões.

O argumento da ressurreição afirma que a melhor explicação para esses fatos é que Jesus realmente ressuscitou dentre os mortos. Mas será que é? Vamos ver…

Qual a melhor explicação para os seis fatos?

O que vamos fazer agora é simples. Vamos comparar diversas explicações que já foram dadas para esses fatos com a explicação de que Jesus realmente ressuscitou. Qual será a explicação mais plausível e lógica?

A) Os discípulos roubaram o corpo de Jesus: Os que sustentam tal explicação, dizem que os discípulos teriam roubado o corpo justamente porque queriam espalhar o mito de que Jesus ressuscitara. Só que isso não explica as aparições experimentadas por muitos, nem a própria doutrina da ressurreição de Cristo para a glória antes do juízo final (que não fazia parte das crenças comuns da época). Também não explica porque os discípulos inventariam tantas mentiras que não os beneficiavam e ainda causavam uma série de prejuízos pessoais.

Devemos notar que a história da morte e ressurreição de Cristo, em sua estrutura, é muito improvável de ter sido inventada, pois soa absurda para a época em todos os pontos. Em primeiro lugar, a crucificação era a pior punição que existia, reservada aos criminosos mais perversos, perigosos ou infames. Um crucificado era para a sociedade um lixo humano. Assim, ninguém criaria uma história em que seu mestre amado, heroi do enredo, termina morto e ainda numa cruz. É pedir para não levá-lo à sério.

Considerando que desde o incío os cristãos sustentavam Jesus como divino, a história se torna mais absurda. Para os pagãos, um deus que morre numa cruz ou seria visto como um deus fraco ou, mais provavelmente, como um mero mortal. Para os judeus, afirmar a morte a morte Deus seria uma blasfêmia e afirmar a morte do Messias, mesmo considerando-o apenas Filho de Deus, seria contradizer toda a teologia judaica da época. Os judeus do primeiro século acreditavam que quando o Messias viesse, iria assumir o trono de Israel, lutar contra os romanos (que os dominava) e elevar a nação ao seu ápice. Essa era uma das crenças mais fortes entre os judeus da época. A morte de Jesus, portanto, era prova cabal para o povo todas de que ele não era o Messias.

Muitos homens surgiram na história israelita proclamando-se o Messias. Eles juntaram seguidores, mas quando morreram, o movimento minguou, alguns voltando para suas antigas atividades, outros crendo que o Messias poderia ser alguém da família do homem que morreu. Mas uma coisa era certa entre todos os judeus: se aquele que se autoproclamava o Messias morreu, ele não era realmente o Messias. Dizer o contrário seria completamente impensável.

Em segundo lugar, a crença na ressurreição corporal não era uma crença comum no primeiro século. Entre os pagãos ninguém cria nisso. Achava-se que o corpo de uma pessoa morria, mas seu espírito (fantasma) permanecia vivo. Esse espírito era imortal e poderia reencarnar em um novo corpo, nascendo de novo. Mas aquele corpo antigo, já era, iria se decompor. Essa crença era tão forte entre os pagãos que em diversas passa-gens do Novo Testamento vemos uma ridicularização por parte deles à ideia de ressur-reição corporal (Atos 17:18, 31-32 e 26:8, 22-25; I Coríntios 1:22-23 e 15:12-20).

Entre os judeus, como já dito, a ressurreição para a glória era entendida como algo que ocorreria no juízo final. Não fazia parte do cotidiano doutrinário do povo esperar ressurreições desse tipo antes do “último dia”. Até ressurreições temporárias em geral eram descartadas (João 11:20-26). E ninguém esperava uma morte e ressurreição do próprio Messias. Então, quando Jesus morreu, a última coisa em que seus discípulos e seguidores pensariam era em inventar a sua ressurreição corporal para a glória. Ainda mais uma ressurreição na qual Jesus iria para o céu, sem vencer o império romano. No contexto da época, essa ideia não tinha como surgir de nenhum lugar. E não havia razão para que fosse inventada, já que soaria absurda.

Considerado o exposto acima, não há boas razões para concluir que os discípulos roubaram o corpo de Jesus e sustentaram por anos diversos absurdos culturais de origem inimaginável, sem qualquer benefício e com muitos prejuízos.

B) Os familiares de Jesus pegaram o corpo: Quem usa essa explicação, afirma que os familiares de Jesus teriam pego seu corpo para dar-lhe um enterro digno em uma tumba da família. Sem saber disso, quando os discípulos viram o túmulo vazio, creram que Jesus havia ressuscitado e saíram espalhando isso. Mas essa explicação tem vários problemas. Primeiro, ela também não explica as visões que várias pessoas tiveram de Jesus. É até bom lembrar que essas visões não foram apenas visões. Na maioria delas, Jesus permitiu que tocassem nele e até se alimentou. O que explica mais de 500 pessoas terem essas experiências?

Segundo, ela não explica porque os parentes de Jesus não disseram aos discípu-los que, na verdade, eles pegaram o corpo para sepultá-lo. É um mal entendido fácil de se resolver. Fora isso, é muito pouco provável que a simples constatação da tumba vazia fizesse todos os discípulos crerem que Jesus ressuscitou. Como já dito, isso não era uma crença comum. Aliás, os próprios evangelhos mostram que a propensão das pessoas era crer que levaram o corpo, não que houve a ressusrreição de Jesus (Jo 20:2; Lc 24:11; Mc 16:11; Jo 20:25).

Terceiro, é pouco provável que um parente de Jesus tivesse ido até o túmulo no dia de sábado. Sábado era o dia sagrado de descanso dos judeus. No primeiro século, era um mandamento cumprido à risca. Como Jesus foi sepultado um pouco antes do pôr do sol de sexta (que já era considerado fim da sexta e início do sábado), então os parentes de Jesus certamente esperariam até domingo para pegarem o corpo. De fato, Lucas faz uma afirmação que corrobora com essa noção:

“Era o dia da preparação [sexta] e começava o sábado. As mulheres que tinham vindo da Galiléia com Jesus, seguindo, viram o túmulo e como o corpo fora ali depositado. Então, se retiraram para preparar aromas e bálsamos. E, no sábado, descansaram, segundo o mandamento” (Lc 23:54-56).

Se nenhum parente de Jesus foi ao túmulo durante o sábado, então não pode ter sido algum deles que pegou o corpo, pois já no domingo de manhã, Jesus não estava lá, e a primeira pessoa a ir ao túmulo, cedo, foi Maria Madalena, não um parente de Jesus.

Quarto, o evangelista Mateus afirma que o túmulo foi guardado por uma escolta romana (Mt 27:62-66), justamente para ninguém pegar o corpo. Se considerarmos o relato como verídico (um historiador poderia descartá-lo por só aparecer em Mateus), então não houve possibilidade alguma de que pegassem o corpo no sábado.

C) Os romanos pegaram o corpo: Aqui começam as exlicações desesperadas dos “céticos”. A afirmação é: os romanos pegaram o corpo de Jesus. Mas por que os romanos iriam roubar o corpo de um homem que foi crucificado? Que interesse teriam no corpo de um mero judeu que foi condenado à pior morte da época? Não faz sentido nenhum isso. Além disso, essa hipótese não explica as aparições experimentadas pelos discípulos e a crença na ressurreição pelos primeiros cristãos.

D) Os líderes judaicos pegaram o corpo: Essa é uma das mais fracas hipóteses que se pode postular. Os líderes judaicos eram as últimas pessoas da face da terra que iriam querer roubar o corpo de Jesus. O que eles mais queriam já havia sido feito: Jesus, o homem que odiavam, estava morto. Não havia motivo para pegar o corpo. A hipótese também não explica as aparições de Jesus experimentadas por mais de 500 pessoas e a crença na ressurreição. Contudo, ainda que desconsideremos isso e aceitemos que os líderes judaicos (ou mesmo os romanos) roubaram o corpo por algum motivo qualquer, seria fácil mostrar o corpo para as pessoas quando os discípulos começassem a pregar a ressurreição. Assim, ninguém mais daria crédito à pregação.

E) Jesus não morreu na cruz, apenas desmaiou: Quem sustenta essa hipótese, afirma que Jesus não teria morrido de verdade, mas desmaiado. Com isso, ele mesmo poderia ter saído da tumba e suas aparições se dariam porque ele estava vivo. Esta hipótese também é frágil. Primeiro, porque dificilmente os soldados que tiraram Jesus da cruz não perceberiam que ele estava vivo. Na verdade, eles devem ter verificado se Jesus morreu ou não com um cuidado especial, já que sua morte foi rápida demais para uma crucificação. De fato, o evangelho de João relata que um dos soltados abriu o lado do corpo de Jesus com uma lança, provavelmente para averiguar se ele realmente estava morto (João 19:31-37).

Em segundo lugar, se Jesus tivesse sobrevivido à cruz, era de se esperar que não tivesse forças para sair do túmulo. Segundo os relatos, havia uma grande pedra na entrada da gruta onde seu corpo fora depositado. Como é que alguém que foi açoitado, espancado e crucificado, tendo desmaiado de tanta fraqueza, teria força para retirar a pedra que tampava seu túmulo? Sobretudo, se realmente havia ali uma escolta. Caso ele conseguisse tal proeza, seria morto pelos soldados. Mesmo que considerássemos que Jesus desmaiou, que ninguém percebeu que ele estava vivo, que o colocaram numa tumba e que mesmo fraco, conseguiu tirar a pedra e sair, isso não explicaria a crença na ressurreição entre os discípulos, já que Jesus teria aparecido muito debilitado. Iriam achar apenas que ele sobreviveu de uma maneira milagrosa.

Em terceiro lugar, a hipótese não explica os relatos de seus aparecimentos e desaparecimentos milagrosos após sair do túmulo, nem de sua ascenção aos céus. Não dá conta também de explicar seu posterior sumiço na história. Se Jesus não tivesse morrido, os discípulos iriam cobrar dele que assumisse o trono. E, pela lógica, se Jesus era apenas um homem normal, a ideia seria boa. Em vez de viver se escondendo, ele poderia retornar à cidade, mostrando que Deus não deixou que ele morresse e, juntando os judeus para livrar Israel da opressão romana. Isso sem dúvida converteria quase todos, talvez até quem concordou com sua morte. Afinal, era o que a interpretação da época achava que o Messias faria.

F) Jesus tinha um irmão gêmeo: Essa hipótese eu vi em um debate. Segundo ela, se Jesus tivesse um irmão gêmeo, ele poderia ter sido confundido com Jesus após a sua morte. Isso explicaria as “aparições de Jesus” e a origem da crença dos discípulos na ressurreição. Essa hipótese também falha. Primeiro, porque não há nenhuma evidência histórica que comprove a existência desse irmão gêmeo. Segundo, porque essa hipótese não explica a constatação do túmulo vazio. Se Jesus morreu mesmo, devia estar lá, não é? Terceiro, se Jesus tinha um irmão gêmeo, é pouco provável que os discípulos não soubessem disso. Os discípulos conheciam a família de Jesus. Então, se vissem o irmão de Jesus, é claro que não pensariam que ele era Jesus. Quarto, o próprio irmão de Jesus não teria interesse de se passar por ele. O que ganharia se passando por um crucificado que quase todo mundo rejeitou? Aliás, é importante lembrar que os irmãos de Jesus não criam nele. Então, nem por questão de honra, seu suposto irmão gêmeo se interessaria em se passar por ele. Quinto, a hipótese não explica os aparecimentos/desaparecimentos milagrosos, nem a asceção ao céu, nem seu sumiço.

G) A ressurreição de Jesus: Chegamos, enfim, à hipótese de que Jesus teria ressuscitado dentre os mortos. Será que ela consegue explicar os fatos? Sim! Ela explica porque Jesus não estava mais em seu túmulo no domingo de manhã, porque mais de 500 pessoas tiveram experiências de ver Jesus após a sua morte e porque os discípulos e pri-meiros cristãos mantinham a crença da ressurreição.

Mais do que isso, essa hipótese explica porque os discípulos e primeiros cristãos pregavam ideias tão estranhas ao pensamento da época, tais como um Messias que não assumia o trono de Israel e que ainda morria crucificado. Explica ainda porque mesmo sendo um homem de carne e osso, que “falhou” em sua missão de Messias e que foi crucificado, Jesus foi considerado divino. Também explica porque os discípulos pre-gavam uma ressurreição corporal de Jesus, quando seriam mais bem aceitos se falassem sobre um “Jesus-fantasma”.

A ressurreição de Jesus explica os fatos, explica a insistência dos discípulos em ideias que entravam em choque com as crenças da época e explica porque os discípulos estavam dispostos a sofrerem hostilidade, perseguição e mortes. Os primeiros cristãos estavam comprometidos com a verdade. E a verdade era que eles tinham testemunhado a ressurreição corporal de Jesus. Então, por mais estranho, esquisito e perigoso que falar sobre isso para o mundo pudesse parecer, os discípulos iriam anunciar essa verdade com toda a intensidade. Isso explica, por fim, a existência e a duração do cristianismo.

Considerações Finais

Chegamos ao fim da explicação do argumento. Agora podemos falar sobre como alguém poderia refutá-lo. Temos duas premissas e uma conclusão. A primeira premissa afirma que existem alguns fatos históricos sobre Jesus que são bem confiáveis e, por isso, aceitos pela maioria dos historiadores. A segunda afirma que esses fatos precisam de uma explicação. A conclusão é que a melhor explicação é a da ressurreição.

A segunda premissa é inquestionável. Fatos requerem explicações e isso se torna bem claro quando temos fatos que não se explicam por si próprios. A conclusão parece ser bem sólida também. Afinal, qualquer exlicação naturalista para aqueles seis fatos não explica todos os eles. Então, creio que o ponto que está mais sujeito à crítica é o primeiro. Será que esses seis fatos sobre Jesus são realmente históricos?

Bem, não vimos razões para achar que não. Expus aqui os dez critérios básicos que os historiadores usam para definir um fato como histórico e confiável. Mostrei que esses seis fatos são amplamente apoiados por esses critérios. Então, para refutar o argu-mento, é necessário que o crítico mostre porque um desses fatos não deveria ser consi-derado histórico. Ou, quem sabe, tentar achar uma explicação mais plausível para eles do que a ressurreição.

Aqui, vale lidar com uma objeção. Alguém afiramr que um historiador não deve pressupor a existência de Deus e que, por isso, não é válido eu colocar a ressurreição como uma explicação possível. Mas sejamos honestos: se um historiador não pode pres-supor a existência de Deus (e concordo), também não pode pressupor a sua inexistência, não é verdade? O historiador deve ser neutro. E foi isso o que fiz. O fato de eu colocar a hipótese da ressurreição ao lado de hipóteses naturalistas mostra que fui neutro. Apenas estava considerando as principais hipóteses para escolher qual era a melhor.

O ponto é: a melhor hipótese é da ressurreição. Não vejo então motivos racionais para não aceitá-la. Isso não é uma pressuposição. Isso é hipótese apoiada por evidências plausíveis. Então, não vejo fundamento nessa objeção.

No mais, quanto à possibilidade ou não de existir Deus, já vimos nas postagens anteriores que a existência de Deus é lógica. Então, por mais que não se pressuponha a crença em Deus, quando chegamos ao ponto em que só a ressurreição de Jesus consegue explicar os fatos históricos que temos nas mãos, é nossa obrigação racional aceitar essa hipótese, não importando no que isso implicará emocionalmente para nossas vidas.

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Posts da Série:

Parte 1: Argumento Cosmológico

Parte 2: Fugindo do óbvio

Parte 3: Argumento Teleológico

Parte 4: Argumento Moral

Parte 5: Um mundo amoral

Parte 6: Argumento da Razão

Parte 7: A possibilidade lógica de milagres

Parte 8: Argumento da Ressurreição

Por Davi Caldas

Fonte: Reação Adventista

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Escritor & Evangelista da União Central Brasileira

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